Expresso do Amanhã - 2ª temporada

Para manter seus ocupantes vivos, o Snowpiercer não pode parar. Igualmente em movimento constante, e turbulento, está o roteiro de Expresso do Amanhã. Ocupando e sobrecarregando os sobreviventes da humanidade em conflitos que sobrepõem, se misturam e afetam um ao outro, na excelente segunda temporada da série sobre o apocalipse glacial. 


A revolução dos fundistas de Andre Layton (Daveed Diggs) mal chegou ao fim, e a nova ordem social do Snowpiercer ainda está sendo construída, quando o trem de suprimentos BigAlice atraca em sua traseira. Pondo fim à breve paz entre classes, ao trazer para a cena o verdadeiro Sr. Wilford (Sean Bean). Um homem autoritário, amargurado e com sede de vingança por ser deixado para trás.

A chegada de um novo antagonista em um momento de fragilidade desta sociedade é empasse suficiente para uma nova profusão de conflitos e problemas. Visto como salvador messiânico por parte dos habitantes, e como vilão implacável pelos demais, colocando lealdades à prova e criando agentes duplos e traidores em ambos os trens. Relações e atitudes desenvolvidas, ou reveladas lentamente ao longo da temporada, enquanto o empasse de poder entre Layton e Wilford se desenvolve. 

Cheio de empatia e incertezas que carrega desde o início da série, o líder fundista precisa se aliar a antigos inimigos, que por sua vez também precisam aceitá-lo. Além de eventualmente usar os mesmos métodos duvidosos de seu rival. Já o criador da locomotiva, se apresenta como figura forte, que inacreditavelmente inspira seguidores apesar de sua crueldade. Qualquer paralelo com a realidade, não é mera coincidência. Dinâmica de opostos eficientemente mantida por seus intérpretes, especialmente Sean Bean, que estreia nessa temporada mergulhando de cabeça na diversão sádica de Joseph Wilford. 

Conformada com a revolução e sua nova posição na hierarquia do trem Melanie Cavill (Jennifer Connelly), tem dilemas próprios além de assistir Layton em sua administração. Finalmente descobrimos como a maquinista deixou o chefe para trás na partida, e acompanhamos seus esforços para reconquistar a confiança da filha Alex (Rowan Blanchard) , resgatada e manipulada por Wilford. Resultando em um surpreendente sacrifício pela humanidade, e no excelente sexto episódio. Many Miles from Snowpiercer foca na missão solitária da personagem fora da locomotiva. 


Narrativas secundárias paralelas, ajudam a aumentar o caos e a tensão, da guerra fria entre as locomotivas, como a investigação criminal de Bess Till (Mickey Sumner) e as jornadas de Miss Audrey (Lena Hall) e Josie (Katie McGuinness). Mais interessante e melhor desenvolvida é o conflito interno da secretária Ruth (Alison Wright, excelente), frequentemente em dúvida quanto a sua lealdade, ao trem e a humanidade, ou ao seu empregador e ídolo cruel. 

Com tanta coisa acontecendo, não é surpresa que alguns personagens desapareçam de cena, como o jovem Miles (Jaylin Fletcher). Entretanto, ha ausência de vozes de outras classes, torna sua insatisfação pouco evidente. Não nos surpreendemos que hajam adoradores da antiga ordem social no Snowpiercer, mas eles pouco tem voz. Fazendo com que a revelação de seu apoio soe fraca na narrativa paralela da detetive Till (Mickey Sumner). Uma falta sentida que não chega a comprometer o andamento total da série. 

Criticas sociais, paralelos com a realidade e as metáforas, tão bem executados no primeiro ano, não apenas estão de volta, mas ganham novas nuances. Uma bastante curiosa, é a negação à ciência de Wilford, ignorando os dados coletados por Melanie e a esperança de uma vida fora do trem que estes proporcionariam, em prol da manutenção de seu poder. Novamente, qualquer semelhança com a realidade, não é mera coincidência, mas um olhar clínico e amplificado, sobre sociedade, hierarquia e jogos de poder, bastante reais. 

A estreia de Expresso do Amanhã, bem no início da Pandemia de Covid-19, proporcionou um olhar inesperado, e inédito, para esta obra apocalíptica. A chegada de uma segunda temporada tão rápido, menos de um ano depois, evolui essa análise com assustadores paralelos com nossa realidade. A série já é crítica e eloquente por si só, no contexto em que chega ao público, é essencial para pensarmos nossa realidade. Sem nunca deixar de ser um excelente entretenimento.

Expresso do Amanhã é baseada na HQ francesa Le Transperceneige (1982), que 2013 virou filme com direção de Bong Joon-ho. A série é uma produção da TNT distribuída mundialmente pela Netflix. Cada temporada tem dez episódios com cerca de uma hora cada, todos já estão disponíveis na plataforma.

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