A quarta temporada de Westworld chegou em 2022 com um desafio enorme, trazer de volta a qualidade que conquistou os fãs, ao mesmo tempo que lida com os enredos ruins do terceiro ano. Fora dos parques, com uma quantidade de personagens limitada, gravando em uma pandemia e com muitas pontas frágeis a solucionar. Tarefa que a série, surpreendentemente executou bem, apesar das limitações enfrentadas.
Anos se passaram desde a guerra causada pela revelação e destruição das atividades do Rehoboam. A versão anfitriã de Charlote Hale (Tessa Thompson) está remodelando o mundo sobre seus parâmetros com a ajuda do anfitrião Homem de Preto (Ed Harris). Enquanto Maeve (Thandiwe Newton) e Caleb (Aaron Paul) lutam contra ela. Christina (Evan Rachel Wood), que parece ser uma outra versão de Dolores sai de sua rotina quando começa a notar inconsistências em seu mundo. Já Bernard (Jeffrey Wright) tenta encontrar o melhor caminho para o futuro do planeta.
Eu sei, esta sinopse da quarta temporada não faz sentido algum. Mas, em se tratando de Westworld, isso é maravilhoso! De volta à linhas temporais diferentes, aos ciclos e símbolos, e oferecendo objetivos mais coerentes para seus personagens, a série retorna as suas origens. Apesar de partir do ingrato final da temporada anterior.
Em um primeiro momento, o roteiro usa jornada de Caleb e Maeve para mostrar como Charlote se tornou o "Deus" daquele mundo, aos poucos entendemos que o jogo virou. Humanos e anfitriões são colocados em uma inversão de papéis, que trazem de volta e expande os debates sobre, livre arbítrio, evolução, extinção, diferenças entre humanos e robôs, a relação entre criador e criatura, que tanto enriqueceram os primeiros anos da série. E assim, com as posições da peças bem definidas no tabuleiro, partimos para a segunda fase da temporada.
É nesse momento que Hale, encarara a realidade de um Criador entediado, e insatisfeito com sua criação. E que apesar de ter total controle sobre tudo e todos, não consegue que a civilização siga seus planos. Bernard se empenha em tornar real a "melhor possibilidade" de futuro para este mundo, com a ajuda de Stubs (Luke Hemsworth), Maeve e a resistência humana. O tema novo da vez é a sobrevivência do mais apto, tanto individualmente quanto como espécie. Anfitriões versus humanos, o roteiro caminha para uma grande batalha entre eles, retornando ao grande "vídeo game da vida real", que eram os parques à princípio.
E por falar em resistência humana, é a jornada de Caleb o ponto fraco desta temporada. O personagem que caiu de paraquedas no ano anterior, continua sub aproveitado, desperdiçando o bom trabalho de seu intérprete. Resta a ele, a única jornada com relação humana do roteiro, através de sua determinação em reencontrar a filha. Até mesmo a obsessão de Charlote por ele, é abandonada de acordo com a conveniência.
O que também evoca, da melhor maneira possível, as boas temporadas do programa é o arco de Christina. Presa novamente em uma rotina, tal qual Dolores no primeiro ano, ela precisa despertar novamente. Os ecos e símbolos do retorno a esta jornada são bem construídos, e respeitam a evolução anterior da personagem. Sim, ela está acordando novamente, mas os parâmetros são outros. Se antes eram sinais externos que ela seguia, agora a busca é interna, restaura e percorre todo o histórico da personagem.
Tudo isso, é claro, apresentando em um roteiro inteligente e ardilosamente construído para que precisemos montar o quebra-cabeças a cada novo episódio. E que, não tem receio de descartar personagens quando necessário. O desfecho, por sua vez é filosófico e cheio de possibilidades. Satisfatório se este for o fim da série, mas também com possibilidades de um último ano que revisaria a primeira temporada. Pessoalmente, acredito que o fim do quarto ano seja um final excelente para a história. Mas, admito, retornar ao cenário do parque para um último grande embate é uma possibilidade tentadora.
A qualidade técnica mantém o alto padrão da série. Não se deixe enganar por momentos em que a atmosfera parece mais superficial, é de propósito! É curioso observar como a produção trabalhou bem a construção de um mundo futurístico, alguns momentos em contraste com velho-oeste de seu início, em outros fazendo referência a ele. Através da boa escolha de cenários, figurinos, fotografia e até as música.
Já o elenco, carismático e bastante familiarizado com seus personagens e a com a complexidade do universo em que estão inseridos, entregam o tradicional bom trabalho. Mesmo Aaron Paul cujo personagem parece estar em uma jornada descartável, entrega excelentes camadas para as diferentes versões de seu personagem. Tessa Thompson traz um pesar e um cansaço genuínos para sua personagem. Enquanto Newton e Hemsworth conquistam apenas por parecerem contentes em estar de volta.
Westworld conseguiu o impossível, partir de um lugar muito ruim, e reconstruir sua qualidade sem perder a coerência ou ignorar acontecimentos prévios. Assim recebemos uma quarta temporada que não é a melhor de todas (a primeira é a perfeita), mas é muito boa. Complexa, rica, coerente e interessante, pode, ou não, ser o desfecho da jornada dos anfitriões. Mas com certeza é um retorno da série aos bons tempos.
As duas primeiras temporadas de Westworld tem dez episódios cada, a terceira e a quarta tem oito, todos com cerca de uma hora de duração. Exibidos pela HBO e disponíveis na HBO Max.
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