Apresentando os Ricardos

O título nacional deste filme do novo filme de Aaron Sorkin não é o mais apropriado para esta cinebiografia. Isto porque a produção do Prime Video conta muito com o conhecimento prévio de quem é Lucille Ball, de sua importância para a TV, e até de seu "menos famoso" marido.

O longa acompanha uma semana crucial nos bastidores da icônica série de TV I Love Lucy. Quando a protagonista e criadora (Nicole Kidman) comunica sua segunda gravidez à produção, desconfia da fidelidade de seu marido (Javier Bardem) que é mostrado como infiel pelos tabloides, e mais grave é acusada publicamente de ser comunista nos EUA em plena guerra fria. 

Começando pelo mais importante, a Biografada. Lucille Ball foi uma atriz e comediante estadunidense, que criou e estrelou, ao lado de seu primeiro marido Desi Arnaz, a sitcom I Love Lucy. Seriado que com seis temporadas, definiu padrões para produções do título usadas até hoje, em séries de meia hora gravadas com plateia como The Big Bang Theory. Uma produção recente que referenciou muito a obra, foi WandaVision, que recriou a série seguindo até métodos de gravação da época. 

São os bastidores da série e os conflitos pessoais de Ball e Arnaz, que acompanhamos ao longo de uma semana, tempo em que se passa a série. Enquanto todo o processo de produção e criação do show, são uma atração à parte para os amantes de séries. Todo o contexto, que transforma estes sete dias em particular, em ponto de interesse parece um tanto forçado. E é!

É verdade, Lucille enfrentou escândalos de infidelidade no casamento. Teve uma segunda gravidez que desafiou os padrões e alterou a forma como mulheres grávidas era retratadas na TV. E foi acusada de ser comunista, foi interrogada pelo governo estadunidense, e gerando grande comoção na mídia. Mas não, estas coisas não aconteceram todas ao mesmo tempo!

O recurso de condensar acontecimentos em um tempo mais curto, para aumentar a dinâmica ou a tensão da narrativa, não é incomum em uma Biografia. Entretanto, no caso de Apresentando os Ricardos, o excesso de conflitos dividem o foco, enquanto flashbacks de como o casal se conheceu e da criação da série, e "entrevistas encenadas" com atores recriando membros da produção no futuro, interrompem o fluxo e confundem o espectador. Especialmente aquele que não está familiarizado com estas figuras históricas, de grande apelo nos EUA, mas menos conhecidas no resto do mundo.

A trama conta ainda com um desfecho "deus ex machina", difícil de engolir, e fictício. Como Desi conseguiu tal depoimento para salvar a reputação de sua esposa? E mais importante, porquê os roteiristas decidiram por criar este falso acontecimento, quando a realidade não é apenas tão eficiente quanto, mas também bastante conhecida? Novamente pelo público estadunidense.

Se o roteiro parece um tanto embolado pelo excesso de temas, e o vai e vem no tempo,  Nicole Kidman, não está nada confusa quanto à personagem que deseja criar. Sua Lucille é complexa, ousada, impetuosa, perspicaz, mesmo enfrentando uma crise e cheia de inseguranças. Além de carregar semelhanças em postura, gestos, expressões e até mesmo na voz com a retratada. Kidman desaparece por trás de Lucille, sem precisar de quilos de maquiagem para ajudar. 

Já Javier Bardem se esforça, mas não pode fazer muito com a forma com que o roteiro trata Desi. Construindo o ator e músico, como o estereótipo do latin lover, festeiro, galanteador e que precisa ter sua autoridade reconhecida de tempos em tempos.

Não há outros grandes destaques na atuação, apesar do elenco qualificado, que entrega o que os personagens pedem, mas não tem espaço para ir além disso. Estão em cena J.K. Simmons, Nina Arianda, Tony Hale, Alia Shawkat, Jake Lacy, Linda Lavin, Clark Gregg, entre outros. Muitos deles, como meros engravatados do estúdio que entram e saem de cena tão rápido que não há tempo de compreender sua função ali, que dirá recordar seus nomes.

 Reconstrução de época, figurinos, cabelo e maquiagem, são eficientes para nos situar no tempo. A fotografia, não traz grandes feitos. E as referências para quem conhece a carreira de Ball, e para fãs do I Love Lucy são muitas.

Particularmente, à exceção da sua existência e do programa de sucesso que a tornou icônica na cultura estadunidense, eu não sabia muito sobre Lucille Ball. Apresentando os Ricardos, exige isso! A produção fala melhor para aqueles criados com a retratada e seu programa como parte da cultura popular. Não é impossível de compreender, e o carisma de Kidman e Bardem captura parte da atenção, mas o filme não funciona tão bem por conta própria. 

Partindo da premissa, que boas produções se bastam sozinhas, e não exigem bagagens específicas do público. Apresentando os Ricardos, tem uma biografada interessantíssima para retratar, mas esquece que para alcançar o mundo, precisa fazer o que o título nacional sugere, apresentá-la adequadamente.

Apresentando os Ricardos
2021 - EUA - 131min
Biografia, Drama

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