A Filha Perdida

Apesar de como a sociedade as pinta, mães não são perfeitas, e nem deveriam precisar ser. Ser mãe é difícil, desgastante e as vezes incômodo. Sensação que A Filha Perdida, filme da Netflix estrelado por Olívia Colman, faz questão de compartilhar com a gente.

Leda (Olívia Colman), 48 anos, professora universitária, divorciada, mãe de duas filhas adultas, decide passar férias solitárias em uma cidade costeira da Grécia. Logo a calmaria de suas férias se transformam em obsessão por uma jovem mãe e sua filha, que frequentam a mesma praia. Trazendo à tona memórias de sua própria jornada como mãe. 

Esta é a estreia na direção e roteiro de Maggie Gyllenhaal, uma estreia ousada e surpreendente. Baseado no livro homônimo de Elena Ferrante, o roteiro nunca nos entrega o esperado ou previsível. Momentos decisivos são, por vezes, atrasados, adiantados, ou sequer acontecem, sem uma fórmula ou cadência definida. Mais ou menos como a vida, né! Afinal no mundo real as coisas não acontecem separadas por atos, ou programadas para trazer mais tensão a um ou outro momento.

Assim, a produção consegue ao mesmo tempo parecer que não tem pretende chegar à lugar nenhum, e manter uma constante tensão, criada pela sensação de incômodo pela incerteza. Estes personagens vão se confrontar? Vai acontecer um romance? Ela vai ser desmascarada? Ele viu aquele objeto? As perguntas são lançadas, pelo roteiro sem pretensão de receber resposta. Algumas recebem, outras não. A intenção aqui é nos manter alertas e aflitos todo o tempo.

Simultaneamente, flashbacks nos dão pistas das motivações para as ações da protagonista. Não que todas vão fazer sentido obrigatoriamente. Além de construir um paralelo com o presente de Nina (Dakota Johnson). A personagem passa por aflições semelhantes, e busca na figura de Leda a sabedoria que esta teria acumulado ao longo da vida.

Emaranhados à narrativa principal os momentos no passado, evidenciam as dificuldades da maternidade, e a humanidade de uma mãe. O surpreendente é que a produção se recusa a romantizar a tarefa, como de costume na ficção. A maternidade é difícil, para algumas um fardo, que se abandonado torna suas vidas melhores. Por mais horrível que isto possa soar. 

É na costura entre estes dois momentos na vida de Leda que a atuação mais se faz presente, quando Jessie Buckley e Olívia Colman, conseguem construir uma unidade entre os momentos distintos da vida a protagonista. Nunca duvidamos de que não se trata da mesma pessoa, de fato conseguimos compreender como a Leda de Buckley, se transformou na de Colman.

Ainda sobre o elenco, Dakota Johnson traz presença, e um olhar aflitivo à sua jovem mãe cheia de dúvidas. Já Ed Harris parece sub aproveitado, como apenas uma das figuras com quem a protagonista interage. Talvez seja proposital, o filme é sobre maternidade, e que papel os homens teriam aqui?

O posicionamento de câmera nos aproxima dos personagens, ao mesmo tempo que a montagem nos desorienta e confunde em muitos momentos. Como se observássemos, recortes ou detalhes aleatórios - muito bem escolhidos na verdade - das vidas destes personagens, inclusive da protagonista.

A Filha Perdida é surpreendente, na forma como conta sua história, na história em si, e na forma honesta e crua como aborda a maternidade. A produção tem a clara intenção de nos instigar e incomodar, e consegue ambos. Não é uma produção para se gostar, mas para refletir e questionar, sem jamais chegar a uma conclusão completa. Leva o espectador para novos caminhos, quer ele esteja preparado, ou não.

 A Filha Perdida (The Lost Daughter)
2021 - EUA - 121min
Drama

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