Dois Papas

Uma longa conversa fictĂ­cia, para discutir crises reais. Dois Papas usa a divergĂȘncia de ideias e posturas entre Bento e Francisco, para pensar sobre fĂ©, escolhas, futuro da igreja catĂłlica e da humanidade, e atĂ© assuntos mais mundanos, como futebol e mĂșsica.

Meses antes da renĂșncia o papa Bento XVI (Anthony Hopkins), em meio ao escĂąndalo do vazamento de documentos sigilosos da igreja, o entĂŁo cardeal Jorge Bergoglio (Jonathan Pryce), Ă© chamado pelo prĂłprio pontĂ­fice para uma visita. O encontro resulta em uma longa conversa que debate o futuro da igreja, o passado, escolhas e crenças de ambos. AlĂ©m de personalidades, gostos e outras particularidades que nos recordam que, apesar do "cargo santo", estes ainda sĂŁo apenas humanos.

Sendo apenas homens, ainda são suscetíveis à falhas. Culpa, responsabilidade e perdão, por terceiros e por si mesmo, estão entre as discussÔes que humanizam e aproximam estas figuras distantes do expectador. Mais flexível, acessível e simples, é fåcil se relacionar com o Bergoglio de Jonathan Pryce, bem humorado, amigåvel e pé no chão. Tornando mais impactantes, os flashbacks que recontam erros e arrependimentos do passado, em um período conturbado da história argentina. Juan Minujín entrega um jovem Bergolio com uma atuação eficiente e que conversa muito bem com o trabalho de seu intérprete mais velho.

Apesar dos dois personagens tĂ­tulo, Ă© o papa argentino que tem mais espaço na trama. O que nĂŁo significa que Bento XVI nĂŁo tenha um arco bem desenhado. Partindo do extremo oposto, uma figura rĂ­gida, conservadora e inacessĂ­vel, que encontra na sutileza de Anthony Hopkins e sua entrega fĂ­sica impressionante, caminho para conquistar a empatia do pĂșblico. Ao longo dos bem escritos diĂĄlogos, descobrimos aos poucos, paixĂ”es, temores e arrependimentos do personagem.

Entre uma discussĂŁo e outra, recriaçÔes do interesse pĂșblico e da mĂ­dia na crise e nos eventos reais, situam o especador mais atento. Trazendo entrevistas, cenas de multidĂŁo e repĂłrteres, que emulam texturas de imagens da Ă©poca, que facilmente podem ser confundidas por reportagens reais. Some-se isso, Ă  detalhista recriação do vaticano, o diretor Fernando Meirelles nĂŁo apenas confere realismo Ă  produção, como se mostra extremamente eficiente em nos fazer acreditar no que nĂŁo estĂĄ lĂĄ. Detalhe que conversa curiosamente com a temĂĄtica de fĂ© da produção.

Embora seja falado majoritariamente e inglĂȘs e espanhol, a cacofonia causada pelos muitos idiomas presentes no vaticano, ilustra bem as dificuldades de discutir temas tĂŁo amplos. Assim como lĂ­nguas diferentes, idĂ©ias distintas podem soar como estrangeiras para outras pessoas. JĂĄ a trilha sonora inusitada, ajuda a manter um tom mais leve, em meio a discussĂ”es tĂŁo complexas. Assim como, alguns momentos cotidianos, bem inseridos arrancam sorrisos e atĂ© uma ou outra gargalhada.

Nossa geração assistiu a um momento Ășnico na histĂłria do catolicismo, aquele em que temos Dois Papas. Entretanto, mais que um momento histĂłrico importante, a produção tira estas figuras do pedestal, para apresentar dois homens de lados opostos da conversa, que atravĂ©s de suas falhas conseguem encontrar semelhanças, e consequentemente respeito.

É verdade, apesar de inspirada em fatos, esta conversa Ă© uma ficção. Bento e Francisco na vida real talvez sejam muito diferentes das versĂ”es de Pryce e Hopkins, mas sĂŁo humanos de todo jeito. E a mensagem de respeito Ă s diferenças passada aqui nĂŁo Ă© apenas atual, Ă© necessĂĄria.

Dois Papas (The Two Popes)
2019 -Reino Unido, ItĂĄlia - 125min
Biografia, Drama

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