Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo

Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo, não há título que descreva melhor o novo filme de Daniel Scheinert, Daniel Kwan ("os Daniels" de Um Cadáver para Sobreviver). Não apenas por sua temática criativa, mas por toda a gama de sentimentos que a produção é capaz de despertar, algumas vezes simultaneamente, em suas pouco mais de duas horas de duração. 

Evelyn Wang (Michelle Yeoh) é uma imigrante chinesa nos Estados Unidos, frustrada e amargurada pela vida sobrecarregada que leva. Entre cuidar da lavanderia falida, do pai supercrítico, o casamento em ruinas, o afastamento da filha e tentar declarar o imposto de renda, ela se ressente por tudo que sua vida poderia ter sido. Sua rotina é quebrada, quando um viajante de outro universo a convoca para salvar o multiverso, explorando as inúmeras habilidades de suas variantes de realidades paralelas. 

A cada escolha com a qual nos deparamos, existe um infinito numero de possibilidades e desdobramentos que nossas escolhas podem acarretar. E se pudéssemos observar e experimentar as consequências das diferentes opções oferecidas? É dentro dessa premissa que Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo encontra caminho livre para explorar quaisquer possibilidades que a criatividade permitir. - E se Evelyn não tivesse se casado com Waymond (Ke Huy Quan*)? E se ela ficasse cega? E se fosse um rabisco em um papel? - Cada versão de sua vida, tem prós e contras, erros e acertos, habilidades e falhas, com as quais a protagonista poderá contar, enquanto salta entre realidade na luta para salvar o universo. É claro, essa possibilidade está aberta à todos os personagens em cena, criando uma imprevisibilidade impar para o roteiro escrito pelos Daniels. 

E a dupla de roteiristas/diretores parece disposta a explorar todo este potencial criativo, e principalmente, administrar o caos oriundo dele. Não apenas construindo uma aventura desvairada, mas cheia de significados. Ao mesmo tempo grandiosa e intimista, a jornada de Evelyn é sim sobre salvar o mundo, mas também é sobre aceitação, de si e do próximo. Sobre a relação de mãe e filha, de marido e mulher, sobre se sentir excluído em um país estrangeiro. Fala da sobrecarga de responsabilidades que a sociedade impõe as mulheres. E sobre entender quem você é, o que poderia ser, e abraçar as consequências de suas escolhas. Tudo isso enquanto entrega conceitos complexos de ficção cientifica e elaboradas sequencias de ação, em três idiomas diferentes.   

É o caos criativo, que se não executado de forma precisa, poderia se tornar uma salada incompreensível. Mas os Daniels, mesmo com um orçamento considerado pequeno para um projeto tão ambicioso, conseguem estruturar este caos com um roteiro preciso, que consegue explicar o necessário sem ser didático, e que transita com facilidade entre a comédia, o absurdo, a tensão e o trama. A montagem inteligente mantém o ritmo caótico de forma compreensível e valoriza as bem coreografadas sequencias de luta. 


Michelle Yeoh aproveita todo o espaço que lhes é dado para explorar todas as versões de si mesma. Oscilando por diferentes sentimentos com facilidade e honestidade, e entregando as sequencias de ação com a graça e eficiência já conhecidas da intérprete. Seu elenco "coadjuvante" também não fica atrás. Ke Huy Quan, Stephanie Hsu e Jamie Lee Curtis também entregam com perfeição as variações e múltiplas possibilidades dos vários multiversos.

Os efeitos especiais são eficientes, enquanto os figurinos e a fotografia expressam com clareza os diferentes universos que piscam na tela todo o tempo. Mas são as sequencias de luta, o elemento que mais enchem os olhos. Tão bem coreografadas e filmadas, quanto  criativas utilizam todas as possibilidades e absurdos que o roteiro permite para torná-las empolgantes, surpreendentes e imprevisíveis. 

É até difícil falar sobre Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo sem se empolgar com mínimos detalhes, e estragar a experiência com spoilers desnecessários. O melhor é encarar a experiência sabendo  o mínimo e com a mente aberta. O que podemos afirmar com toda certeza, é que a produção traz um verdadeiro e delicioso multiverso da loucura, que vai te fazer rir, chorar, temer e torcer por Evelyn, tudo ao mesmo tempo, em todos os lugares e situações pelas quais ela passa.

Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo (Everything Everywhere All at Once)
2022 - EUA - 139min
Ação, Aventura, Comédia, Drama, Ficção científica 

*Achou o ator familiar? Ke Huy Quan é o interprete de Short Round de Indiana Jones e o Templo da Perdição e de Data de Os Goonies, que retorna à atuar após um hiato de vinte anos.  

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