Maria e João: O Conto das Bruxas

Os contos coletados pelos Irmãos Grimm, em geral tinham suas lições bastante claras. No caso de Hansel  & Gretel (João e Maria, para nós), obedecer aos pais e não aceitar doces de estranhos. Maria e João: O Conto das Bruxas tenta extrair um novo conteúdo dessa história tão familiar.

Maria (Sophia Lillis de It: A Coisa e Objetos Cortantes) e João (Samuel Leakey) vivem em uma época de fome e peste. Os irmãos são expulsos de casa pela mãe, quando esta decide/percebe que não é capaz de mantê-los. Em sua busca floresta à dentro por casa e comida, os dois são acolhidos por Holda (Alice Krige), velha estranha que vive isolada em uma casa onde estranhamente há fartura.

Apesar de inspirado em um conto para crianças, esta nova adaptação é uma produção de terror, que se aproxima ao tom sombrio e cruel da tradição oral do conto. É na construção desta atmosfera, ameaçadora, depressiva e mística, que o filme tem seus maiores métodos.

A direção de arte acerta ao construir um mundo decadente, simplório e ao mesmo repleto de símbolos macabros. Enquanto a fotografia, aposta construir cenas iluminadas aparentemente luzes rústicas (velas, fogueiras). Criando, ao mesmo tempo que mostra o que deseja, uma infinidade de "coisas não vistas" nas sombras e penumbras. Sem usar o batido, e incômodo, artifício da escuridão total para causar o medo.

O foco em Maria, é outra bem vinda mudança desta adaptação, que além de lições ensaia uma jornada de amadurecimento. Ao mesmo tempo que explora conceitos sagrado feminino, e mitos de magia ao desenvolver a relação entre Maria e a bruxa. Esta última também ganha uma bem vinda história própria, ao invés de ser apenas uma bruxa que vive na floresta. Some-se esta temática, a escolha de um terror criado pela atmosfera, ao invés de sustos, com ritmo contido e tempo para desenvolver a história e observar os personagens, e as comparações com o A Bruxa (2015), são inevitáveis. Entretanto, os acertos e comparações com o filme de Robert Eggers para por aqui.

Apesar de construir um universo interessante e cheio de possibilidades Maria e João: O Conto das Bruxas parece não ter certeza sobre qual caminho seguir. Indicando muitas boas ideias, mas não se aprofundando de fato em nenhuma. Desde o canibalismo presente no conto, ou uma versão diferente que poderia ser abordada através da aparição aleatória de um zumbi, passando pela magia como entidade onisciente, onipotente e onipresente, até o amadurecimento de Maria, não faltam bons rumos para a produção.

A escolha, entretanto, é pelo caminho mais simples e pobre. Um embate sem muito significado, e de resolução absurdamente simples. Não fique surpreso ao se perceber esperando por um rebote da vilã, para aplacar a sensação de que a mocinha se safara fácil demais. A revanche não vem, a resolução foi fácil, e fica por isso mesmo.

Alice Krige é quem melhor se destaca, ao criar uma criatura fisicamente frágil, mas psicologicamente ameaçadora. Sophia Lillis entrega uma atuação propositalmente austera, e sempre incomodada, enquanto Samuel Leakey faz o que lhes é pedido e apenas isso. Charles Babalola também não tem muito a oferecer com seu personagem que não oferece muito à trama, de fato sua ausência provavelmente não faria diferença. No geral é um bom elenco, mas que não consegue extrair muito do material que lhes é oferecido.

Maria e João: O Conto das Bruxas tem um argumento interessante, cheio de potencial, e consegue construir uma atmosfera macabra própria. Entretanto, seu roteiro fica aquém do que poderia, sem se comprometer com nenhuma das idéias que planta, e consequentemente não entregando muito ao espectador. Enquanto o João e Maria originais, sabiam bem o que lições queriam contar, sua nova versão parece não fazer ideia de para onde quer ir e quais ideias defender. Deixando o público mais perdido e insatisfeito, do que aterrorizado. Tarefa difícil, afinal, quem não teria medo de uma velinha canibal que atrai crianças com doces?

Maria e João: O Conto das Bruxas (Gretel & Hansel)
2020 - EUA - 87min
Terror




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