It: A Coisa

Apesar de vivermos no que parece ser a "era da adaptação", é difícil não ficar igualmente desconfiado e empolgado toda vez que uma nova versão de um clássico ou best-seller chega às telas. Logo, é em meio à grande comoção que a nova adaptação de It: A Coisa de Stephen King estreia.

Na cidadezinha "estadunidense" de Derry, crianças desaparecem misteriosamente há quase um ano, quando um grupo de crianças conhecido como "Losers Club" (clube dos perdedores) começa a vivenciar seus medos de forma peculiar. É claro, que em plena década de 1980, a molecada não exita em pegar as bicicletas e desperdiçar as férias de verão investigando o caso.

Bill (Jaeden Lieberher), o menino gago cujo irmão foi o primeiro a desaparecer - em uma cena forte logo nos primeiros minutos do filme, diga-se; Richie (Finn Wolfhard), aquele amigo piadista que não sabe a hora de ficar quieto; Eddie (Jack Dylan Grazer) o hipocondríaco/germofóbico do grupo; Ben (Jeremy Ray Taylor) o gordinho; Stanley (Wyatt Oleff) o judeu; Mike (Chosen Jacobs) o negro que estuda em casa e Beverly (Sophia Lillis) a única menina. Arquétipos comuns de histórias de escola dos anos 80, mas muito bem apresentados. As dificuldades cotidianas, as personalidades distintas, seus medos e até a forma como alguns deles se tornam amigos são explicados sem correria. Para aqueles que entrarem no cinema atrás apenas de sustos fáceis, essa construção detalhada pode soar lenta, mas acredite, é aí que reside a alma do filme. Já que, por mais que o chamariz deste, então chamado, filme de terror seja Pennywise (Bill Skarsgård), o filme não é apenas sobre isso.

Calma, não fuja do longa ainda. Existe sim um palhaço maléfico que come criancinhas ameaçando todos. Entre suas habilidades aterrorizantes está a de emular nossos maiores medos, e são estes medos particulares que mais tem impacto e que os protagonistas precisam superar - inclua aí inclusive o medo de palhaços. Trata da passagem da infância para a idade adulta enfrentando aquilo que tememos, e também das maldades que nós humanos somos capazes de comeer. Bullying, pedofilia, agressão doméstica física e psicológica, racismo, intolerância religiosa entre outros desafios que falam diretamente com quem está do lado de cá da tela.

Com uma narrativa sem pressa, preocupada com contar bem a história It, dá tempo para cada uma das sete crianças enfrentar e superar seus respectivos desafios, apresentando bem o contexto em que estes temores são alimentados, oferecendo um bem vindo respiro que torna a próxima cena aterrorizante ainda mais eficiente. Assim, consegue construir a tensão sem abusar de sustos fáceis. Preferindo o suspense da ameaça permanente e crescente. O único escorregão aqui fica por conta da previsível trilha sonora que já te alerta de ante-mão os momentos em que deve ter medo. Mas, tudo bem, pois a essa altura nossa empatia com os personagens compensa a falha.

Embora palhaços já sejam sinistros por natureza, o design de Pennywise consegue causar incômodo até em quem não tem coulrofobia - medo de palhaços - sensação que aumenta com a atuação de Skarsgård. Embora ele não seja a ameaça mais assustadora em cena, suas aparições trazem uma violência gráfica própria e até criativa, como a cena em que as crianças observam slides.

E por falar nas crianças o elenco mirim está muito bem. O destaque fica com Lillis, a menina é quem tem os medos e sequências mais pesadas e se sai bem nelas. A produção também resistiu a tentação de escalar Wolfhard para um papel parecido com o que ele viveu em Stranger Things (outra produção passada na década de 1980, onde coisas sinistras acontecem com crianças). Cabê à Richie as piadas sem noção estrategicamente situadas para quebrar um pouco a tensão e relembrar ao público que os personagens ainda são crianças.

Acertadamente situado nos anos 80 (nos livros esta parte da trama se passa nos anos de 1950), uma época mais reconhecível para os adultos que assistirão o filme, mas ainda pré-politicamente correto para as crianças poderem correr soltas por aí, e os adultos serem as pessoas menos informadas do mundo. O tom é parecido com o de outra adaptação de King, Conta Comigo, enfatizando a evolução e relacionamento dos personagens durante a jornada. It: A Coisa é na verdade um filme sobre amizade e amadurecimento, com um incentivo de uma palhaço maléfico, para tornar tudo mais interessante. Tem personagens complexos e carismáticos, além de nostalgia e da promessa de uma sequência que o tornará mais completo como adaptação. Só fica faltando descobrir mesmo porquê palhaços são tão sinistros.

It: A Coisa (It)
2017 - EUA - 135min
Terror, Drama, Suspense

Post a Comment

Postagem Anterior Próxima Postagem