Missão no Mar Vermelho

O texto contextualizador que aparece logo no início de Missão no Mar Vermelho, é mostrado por pouquíssimos segundos. Tão rápido que cheguei ao ponto de voltar o trecho e pausa-lo para poder ler. É com esta contextualização fraca que a produção segue ao longo de suas horas de uma história inspirada por um fato.

É 1979 e a Mossad, agência de inteligência israelense tem a missão resgatar os judeus etíopes refugiados no Sudão e levá-los para Israel. Ari Kidron (Chris Evans) tem a mirabolante ideia de administrar um resort de mergulho na região como fachada para a missão.

Entre um resgate mirabolante digno do Capitão América, e uma longa e torturante caminhada de refugiados Missão no Mar Vermelho, começa bem ao indicar que mostraria a jornada de um grupo perseguido em busca de sobrevivência. Mas bastam alguns minutos, para percebemos que a tocante cena da travessia do rio fora um acerto acidental de uma produção que não descobriu que tipo de história pretende ou poderia ser.

Basta reparar como Kidron convoca seus "especialistas" logo após a criação da missão no hotel. Em uma montagem que lembra a seleção de um time em um filme de roubo como Onze Homens e um Segredo. Entretanto, essa seleção à dedo, nunca é justificada já que não sabemos muito além do nome destas pessoas, e suas atividades em relação à missão geralmente se limitam a conduzir caminhões, ou administrar um hotel. Mesmo os conflitos entre eles, se limitam a todos discordarem do personagem de Evans, mas mesmo assim obedecê-lo.

E por falar no Ari Kidron, é ele o herói da história, em todos os sentidos da palavra. Seu arco inclui um passado como refugiado e o distanciamento da família por estar sempre trabalhando, ambos apresentados de forma superficial. Além da determinação quase sobre humana para salvar pessoas, por vezes, irresponsável, ególatra e contraditória. Como nos momentos em que tenta convencer Kabede (Michael Kenneth Williams), que este já fizera o suficiente, apenas para não aceitar a mesma lógica quanto esta é imposta a ele mesmo.

Ainda sim, não é o tratamento raso dado ao seu protagonista que chama a atenção na produção, mas sim a escolha dele como único olhar sobre a história. Repetindo a fórmula já altamente criticada do salvador branco, sem mostrar. Aos negros e pobres que "precisam" da boa vontade dos brancos, não é dada a voz que merecem, que ao menos apontaria a importância de seu resgate, como povo e cultura. À exceção de Kabede, que aparece e desaparece conforme a necessidade do roteiro, e de uma única sequência em que uma mulher aponta suas dificuldades como refugiada, a maioria dos resgatados é de uma massa sem rosto. Não satisfeitos com o salvamento de brancos israelenses, a produção estadunidense encontra uma desculpa para incluir a CIA no roteiro.

E por falar no roteiro, a alternância de tons continua por toda projeção. Ora com momentos mais cômicos, como quando a equipe percebe que o hotel de fachada, vai precisar funcionar de verdade; Ora mais tensos com a vida de centenas de pessoas em risco. Mas a leveza dos momentos de humor, atrapalham a tensão da construção do perigo iminente, esvaziando os riscos que só são realmente sentidos quando deixam de ser apenas uma probabilidade. É o ataque surpresa, ou os confrontos com o Colonel Abdel Ahmed (Chris Chalk). O personagem de Chris Chalk inclusive, é a personificação do perigo de serem desmascarados, embora não fosse o único que pudesse fazê-lo. Sua composição exagerada, está no limite da caricatura de vilão, é apenas pela violência em cena, e pelo conhecimento da parcial veracidade da história que funciona.

Sem impressionar em seus aspectos técnicos, reconstrução de época, fotografia e trilha sonora entregam apenas o que a trama precisa. Já o elenco que conta também com Michiel Huisman, Alex Hassell, Haley Bennett, Alessandro Nivola, Greg Kinnear e Ben Kingsley, entrega boas atuações dentro do pouco que o roteiro lhes permite trabalhar. São Evans e Williams quem tem mais material para trabalhar. O primeiro mantém a postura de herói que já conhecemos dos filmes da Marvel, enquanto o segundo é quem melhor representa toda a carga dramática da situação dos refugiados.

Nessa mistura desencontrada de história real, drama, espionagem, e filme de equipe, há ainda tempo para desnecessárias nudez e decotes. Mas não para contextualizar o espectador, que não deveria ser obrigado a ter conhecimento prévio do caso. O resort fachada para a missão humanitária de resgate realmente existiu, e funcionou por cerca de quatro anos. Nomes, eventos e circunstancias não são as mesmas apresentadas no longa. A produção assume que é apenas inspirada, não baseada em fatos, mas a sequência de créditos com imagens da missão real, deixa claro que o filme quer ser referência sobre o fato.

Inspirado por um evento real e complexo, Missão no Mar Vermelho não decide que tipo de filme quer ser. Uma produção de espionagem curiosa, ou um drama humano ainda frequente e relevante nos dias de hoje. No final, torna-se apenas uma curiosidade que desperdiça temas e oportunidades, enquanto pouco oferece de informação ao espectador, seja da versão original da história, ou mesmo de sua recriação romanceada.

Missão no Mar Vermelho (The Red Sea Diving Resort)
2019 - EUA - 129min
Ação, Drama

Post a Comment

Postagem Anterior Próxima Postagem