Enquanto no cinema a DC ainda luta para fazer seu universo heroico funcionar, na TV seus personagens com capas, roupas colantes e habilidades especiais passam muito bem. Titãs a nova empreitada lançada pelo serviço de streaming da DC - que no Brasil chegou pela Netflix - expande ainda mais as possibilidades para personagens de quadrinhos na telinha.
Criado na década de 1960, o super-grupo formado por sidekicks e personagens coadjuvantes já teve diversas versões e formações ao longo dos anos em diferentes plataformas. Nesta versão live-action para TV, acompanhamos o encontro de Robin, Ravena, Estelar e Mutano. Reunidos pelas consequências de uma misteriosa caçada à um deles. Ao mesmo tempo que acompanhamos a parceria forçada se tornar uma escolha ciente, também acompanhamos os arcos individuais de cada um deles.
Dick Grayson, o Robin original (Brenton Thwaites, O Doador de Memórias), rompeu com Batman, e agora divide seu tempo entre o trabalho na polícia e o vigilantismo descontrolado nas ruas de Detroid. É assim, que Rachel Roth, a Ravena (Teagan Croft), esbarra em sua história. A adolescente com habilidades que não compreende, nem controla, está sendo perseguida por pessoas e motivações desconhecidas. Desconhecida também é a natureza de "Kori Andrews", a Estelar (Anna Diop, 24: Legacy) perdeu suas memórias. Tudo que sabe é que também está à procura de Rachel.
É Gar Logan, o Mutano (Ryan Potter, Operação Big Hero), quem tem o arco mais fraco. Usado principalmente como alívio cômico e como recurso para apresentação da Patrulha do Destino. Outros heróis que ganham destaque ao longo da série são Rapina e Columba (Alan Ritchson, Smallville e Minka Kelly, Friday Night Lights). Há também espaço para participações especiais de outros nomes conhecidos, que não pretendo mencionar para não estragar a surpresa.
De volta ao elenco principal, são Robin e Ravena aqueles que tem sua relação e arcos melhor trabalhados. Pela primeira vez no papel de tutor de alguém o Menino Prodígio, tem a chance de enxergar seu relacionamento com Batman por outro ângulo, ao mesmo tempo que tenta lutar contra o instinto violento estimulado pelo vigilantismo. Já a garota precisa aprender a controlar as trevas que tem dentro de si, e aprender a usar suas habilidades.
Estelar rouba a cena sempre que aparece, mas tem seu desenvolvimento arrastado para dar espaço para outros personagens. É apenas no final da temporada que começamos a entender quem ela realmente é. Com Mutano, a série surpreende ao ter coragem de mostrar suas transformação em tigre, através de efeitos que não são excepcionais, mas funcionam muito bem dentro do estilo e orçamento da série. O mesmo vale para outros efeitos, como as manifestações de poderes de Ravena e Estelar.
E por falar em estilo, Titãs não tem vergonha da tradicional caracterização dos quadrinhos. Capas, máscaras, roupas exageradas e cabelos coloridos estão presentes, e curiosamente não soam destoantes no tom mais sombrio da série. À exceção são os figurinos de Rapina e Columba, que apesar de estarem no tom correto, são simplesmente feitos e nada funcionais em lutas. A moça sofre também a caracterização em sua versão civil. Kelly usa uma peruca falsa demais até para um universo de cabelos verdes e magenta.
Com censura alta, 16 anos, a série tem a chance de ir além das coloridas e leves "primas" da CW. Palavões, sexo e uma alta dose de violência são permitidos aqui. A escuridão nas cenas de luta podem incomodar alguns, mas é coerente com quem foi treinado pelo Cavaleiro das Trevas.
O mais importante aqui é que nem a ação, nem a violência são gratuitas e abrem espaço quando o drama humano exige. Titãs está mais interessado em apresentar e construir uma relação entre seus personagens, do que apenas explorar suas incríveis habilidades. Gerando mais empatia com o espectador.
Empatia que torna o desfecho da temporada um tanto quanto frustante. O programa deixa seus protagonistas em um gigantesco e desnecessário gancho. À essa altura já nos importávamos o suficiente com os personagens, para não precisar de estímulos para esperar por uma segunda temporada. O resultado é um final anti-climático, que enfraquece a excelente experiência do programa até aquele momento. E que não é contornado pela "misteriosa" cena pós créditos. Sim, tem uma, não deixe de assistir.
Outro ponto fraco são as grandes pausas na narrativa para apresentar ou explotar melhor o alguns personagens. Os episódios Jason Todd, Hank and Dawn e Dick Grayson, sexto, nono e décimo primeiro respectivamente, interrompem a trama do quarteto para trabalhar melhor seus personagens título. Desenvolvimento que funcionaria melhor se fosse diluído ao longo da temporada, ou mesmo trabalhado de forma mais breve. O caso do episódio 11 é ainda mais aflitivo, já que se trata do season finale, e não demora muito para notarmos que o verdadeiro desfecho da trama principal será adiado.
O balanço geral, no entanto, é positivo, a série é bem produzida, tem personagens carismáticos, um elenco eficiente e uma história envolvente o suficiente para sustentar uma maratona. O programa também acerta ao adaptar estes personagens, e apresenta-los de forma simples, mesmo para quem não os conhece dos quadrinhos ou animações anteriores.
Entretanto seu maior mérito talvez esteja no novo caminho que ela aponta. Menos sóbria e intensa que o universo da DC nos cinemas, mas muito mais pesada que as séries do Arrowverse, Titãs não tem vergonha de ser quadrinhos. E descobriu que não precisa abrir mão de um conteúdo mais adulto, para abraçar o lado colorido e exagerado do universo dos super heróis.
A primeira temporada de Titãs tem 11 episódios, todos já disponíveis na Netflix. A segunda temporada já foi confirmada, assim como o spin-off Patrulha do Destino.
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