Bird Box

Não raramente, os bons filmes sobre o fim do mundo não tratam do apocalipse propriamente dito. E sim, das pessoas enfrentando a catástrofe, ou mesmo o mundo após. O que torna cada filme único, são as imposições que a nova ordem impõe à sobrevivência, e principalmente as personalidades que a habitam. É por esse caminho que segue a nova produção da Netflix.

Em Bird Box, Sandra Bullock é Malorie. Solteira, prestes a dar a luz ao primeiro filho não planejado, ela tem dificuldades em se conectar com as pessoas, quando um evento apocalíptico a força a conviver com desconhecidos. Cinco anos mais tarde, a protagonista atravessa descendo um rio, com duas crianças, todos com vendas nos olhos.

Sim, a premissa é conheida, o diferencial aqui é como a história é contada em dois momentos no tempo. Saltando enter o momento em que o mundo mudou drasticamente, quando algo levava pessoas cometerem suicídio,e o presente cinco anos mais tarde em um barco. Aguçando a curiosidade do espectador pelo que aconteceu no intervalo entre estes dois momentos.

No passado, a tensão é construída pela convivência forçada com estranhos. Um grupo que atende aos estereótipos do gênero, os opostos que agora são obrigados a conviver, o medroso, o altruísta, o ingênuo, e por aí vai. Á exceção é o nada agradável personagem de John Malkovich, que cria uma dinâmica interessante com a personagem de Bullock. 

Outro ponto de tensão é a necessidade de entender a ameaça, e encontrar maneiras de sobreviver à ela. A forma como o grupo deduz que a ameaça ataca aqueles que olha para ela, é aleatória e bastante questionável. Entretanto, o que importa aqui, é como eles lidam com essa informação, não como a obtiveram. Além das eficientes metáforas sobre gaiolas, a tal caixa de pássaros do título.

Também forçadas são algumas escolhas previsíveis e até clichês do roteiro. Como a pessoa ingênua que coloca o grupo em risco. Ou mesmo o acúmulo de acontecimentos simultâneos improvável no clímax. Há até um parto duplo!

De volta ao presente, a tensão é criada pela privação de um dos sentidos. É aqui que reside a comparação que muitos tem feito com outro thriller deste ano, Um Lugar Silencioso. A imersão aqui não é tão eficiente quando na produção onde é proibido fazer barulho, mas a escolha por não mostrar a ameaça - se eles não podem ver, nós também não - é eficiente. E somada à solidão e a agressividade da natureza, cria sequencias enervantes.

O escorregão aqui fica no mal explorado uso das crianças. Super obedientes e sem personalidade distinguíveis Garoto e Garota (Julian Edwards e Vivien Lyra Blair) são fofos, indefesos e apenas isso. O que torna pouco crível quando a menina esboça medo da protagonista. Porque ela tem medo? Desde quando? Porque nunca expressou isso, nas mais de quarenta horas que a acompanhamos no rio? O tema tinha potencia, mas foi mal desenvolvido.

A conexão entre os dois tempos, é acertadamente feita através dos desafios que Malorie encontra no futuro, e a situação no passado que lhes deu a ferramenta para lidar com eles. A produção não tem medo de mostrar violência, e potencializa o terror dessas cenas. O destaque fica com a sequencia onde o cataclisma ocorre, com o caos instaurado nas ruas e a excelente, porém extremamente curta, participação de Sarah Paulson.

Baseado no livro Caixa de Pássaros de Josh Malerman, Bird Box acerta em se preocupar com as relações humanas, dispensando explicações sobre o evento que acomete a humanidade. Novamente, se os personagens não sabem, nós também não precisamos. As poucas descobertas dos sobreviventes, são feitas ao mesmo tempo pelo público. Isso gera uma empatia orgânica e eficiente, mesmo com personagens mais genéricos. Focada no tema da maternidade e da conexão que permeiam a produção, Sandra Bullock consegue conferir empatia e temor suficientes para que Malorie carregue a produção, com a urgência que deixa o espectador na beirada da cadeira por toda a projeção. No final, é um filme sobre uma mãe no fim do mundo.

Bird Box
2018 - EUA - 124min
Suspense, Terror

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