Maniac

Foi em Superbad - É Hoje, que muita gente viu Emma Stone e Jonah Hill pela primeira vez. Onze anos - um Oscar para ela, e duas e indicações para ele - depois, a dupla se reencontra em um novo trabalho. Tendo em vista o crescimento da carreira de ambos não é surpresa que eles tenha escolhido para atuar e produzir um projeto bastante diferente, e mais desafiador, que o jovem clássico da comédia besteirol.

Owen (Jonah Hill) sofre de esquizofrenia. Annie (Emma Stone) desistiu da vida após um grande trauma. Perdidos, desconectados e desesperados, ambos escolhem servir de cobaia de testes de um medicamento que pretende acabar com qualquer tipo de dor humana.

Apesar da premissa simples, Maniac é no mínimo uma obra complexa, já que o tal tratamento cria fantasias para fazer com que os pacientes compreendam, confrontem e superem seus traumas. Assim, acompanhamos os protagonistas em aventuras em eras e gêneros distintos, durante as várias fases do tratamento. É aí que a série fica interessante, já que tais aventuras da mente, são reflexos do mundo real, e estão cheias de referências, paralelos, easter-eggs e múltiplos significados.

E embora a série destine os dois episódios iniciais para apresentar seus personagens principais e a curiosa realidade em que vivem. É durante seu processo de auto-descoberta, que nossa empatia com eles chega ao auge. Especialmente Owen, cuja apatia com que encara o mundo e sua condição naturalmente, e propositalmente, afasta todos. Mais relacionável, o trauma de Annie, facilita nossa conexão com ela, e acaba fornecendo mais ferramentas para Stone se sobressair.

E por falar em atuação, Maniac é o paraíso de qualquer ator. Já que seus personagens assumem diversas personas, desafiando-os a encaixar a personalidade de Annie e Owen e épocas, situações e tramas, que estes não enfrentariam no mundo real. Figurinos, maquiagem e perucas absurdas são uma diversão à parte, nesta oportunidade incomum de apreciar a versatilidade da dupla.

Curiosamente, também é a caracterização o ponto fraco da produção. Enquanto Stone e Hill, brilham no mundo dos sonhos, do lado de fora os cientistas tentam manter a experiência nos trilhos. A Dr. Azumi Fujita, vivida por Sonoya Mizuno (Ex-Machina) parece presa pela pesada caracterização. Mas é Justin Theroux (The Leftovers) quem chama mais atenção negativamente. Exagerado ao ponto de ser patético, seu Dr. James K. Mantleray, destoa do restante do elenco, mesmo em relação ao tom caricato que a produção escolheu dar aos cientistas. 

Resta à Sally Field, tentar - sem sucesso, diga-se - equilibrar o núcleo como a Dr. Greta Mantleray. É também no núcleo cientifico, que a trama tem seus momentos mais arrastados, apesar de sua boa premissa, que vai permanecer incógnita nesta resenha, para não estragar um de seus poucos acertos.


O elenco ainda conta com boas participações de Allyce Beasley, Gabriel Byrne e Selenis Leyva (Orange is the New Black). Os destaques aqui ficam com Billy Magnussen (A Noite do Jogo) e Julia Garner (Ozarc), irmãos de Owen e Ellie respectivamente.

De volta à trama principal, o ritmo da história também muda para atender aos roteiros das fantasias dos protagonistas. Logo, é provável que alguns episódios pareçam mais frenéticos que outros. Vale também mencionar, que os dez episódios tem tamanhos distintos. O mais longo tem 47 minutos, o mais curto 27. Os vinte minutos de diferença são perceptíveis, mas funcionam,  já que são pensados para atender as necessidades daquele trecho da jornada.

Outro aspecto a se prestar atenção nesta produção é a ambientação. A história se passa em 2018, mas não o nosso 2018. Muito menos, um 2018 distópico, altamente tecnológico ou apocalíptico. Trata-se de um 2018 imaginado por uma pessoa do final da década de 1980. Monitores gigantes, computadores com muitos botões luminosos e coloridos, neon, cigarros liberados em qualquer ambiente, tecnologias e procedimentos científicos que não fazem muito sentido, alguns figurinos e cabelos, estão entre os pontos de adorável estranheza deste mundo.

E como toda "ficção-cientifica datada", nem toda previsão é errada afinal, mesmo que apresentada de um jeito diferente. Um acerto desta visão oitentista do nosso presente, fica por conta do excesso de publicidade que cercam os personagens, e aqui as propagandas apresentadas de uma forma peculiar. O outro fala de solidão, e relacionamentos artificiais, já que é possível alugar um amigo que vai interpretar a história que você quiser. Quem não pensar nas redes sociais e nas "vidas maravilhosas" que montamos nelas, que atire a primeira curtida.

Sonhos são a forma do inconsciente tem de lidar com os problemas do dia-a-dia. Maniac potencializa essa lógica, criando diferentes mundos e experiências complexas, para que seus protagonistas superem seus traumas. O resultado é uma experiencia surreal, que desconstrói a diferença entre sonho e realidade, em prol das relações humanas. Uma obra ao mesmo tempo estranha e inteligente, que deve agradar quem estiver disposto a embarcar em algo realmente diferente.

Maniac é uma minissérie de dez episódios, todos já estão disponíveis na Netflix.

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