O Retorno de Simone Biles

E não é que a Netflix estava realmente filmando! O meme que divertiu fãs brasileiros da ginástica durante os jogos de Paris 2024 era real. O que não significa que a produção estadunidense sobre sua maior ginasta mostraria tudo que fora filmado. Ingenuidade nossa esperar por isso. 

A segunda parte de O Retorno de Simone Biles, série documental que acompanha o retorno a atleta à uma olimpíada acompanha a preparação e os jogos deste ano. Com uma narrativa muito mais confiante (leia-se menos humilde) que a primeira, e melhor parte. Quando a produção abordou traumas, dificuldades e superação da moça.

Agora, já reabilitada e focada, Simone até demonstra certa ansiedade e nervosismo, mas nunca de fato desce do pedestal onde fora colocada. Símbolo máximo disso pôde ser visto ainda nos jogos, antes do lançamento dos episódios finais, quando a moça ostentava um pingente de uma cabra. O animal chamado goat em inglês, representa a sigla do título que a ginasta recebeu e abraçou "Great Of All Time" (melhor de todos os tempos). Humilde né!

Essa postura que talvez surja mais da narrativa que dela. É difícil dizer. Destrói boa parte da empatia construída nos episódios iniciais. Como se a moça, em sua autointitulada "jornada de redenção", tivesse esquecido qualquer aprendizado vindo da queda, precedida pela soberba em Tóquio 2020. Afinal fora exatamente essa postura, de se colocar como a melhor, com a obrigação de levar todas as medalhas que colaborou para seu colapso. Juntamente com traumas acumulados anteriores, é preciso mencionar.

Para os brasileiros a perda da empatia é um pouquinho maior, já que todas as interações entre Simone e Rebeca Andrade se mostram calculadas desde o princípio. Talvez um "plano B" caso a atleta brasileira a superasse em muitas modalidades. E como não foi o caso, foram descartadas. Colocando aquela que fora nomeada como principal adversária como mais uma competidora derrotada. 

Escolha narrativa que fica evidente quando a série termina literalmente antes da competição. Coroando sua retratada como a melhor do mundo após o resultado do individual geral, e parando a história por aí. Ignorando a competição individual por aparelhos onde Simone ganhou mais três medalhas douradas, mas perdeu uma. A icônica cena da referência das atletas americanas à Rebeca no lugar mais alto do pódio alias, é usada por segundo em uma montagem fora de contexto. Afinal, a narrativa já colocara Simone como a melhor de todos os tempos, não é mais necessário mostrá-la sendo humilde. 

Essa soberba se entende para os depoimentos de parentes e amigos. Além de seu marido que já conquistara a antipatia do público nesse interim entre as duas partes do documentário, por declarações públicas infelizes. São as declarações de grandes atletas de gerações anteriores como Nadia Comăneci as falas que transmitem maior veracidade, mesmo que também selecionadas à dedo.

Finalmente completa na plataforma, O Retorno de Simone Biles parecem duas séries em uma, com duas retratadas distintas. A primeira uma jovem em busca da superação do pior momento de sua vida e carreira. A segunda uma mulher confiante de suas habilidades, que parece pouco ter aprendido das dificuldades.

Qual das duas é verdadeira? Provavelmente ambas. Mas o documentário não conseguiu abordar sua retratada para além do maniqueísmo, e mostrá-la como pessoa complexa que todos somos. Resultado do usual ponto de vista patriótico e soberbo estadunidense. Entregando uma produção que começa extremamente empática, mas termina isolando Simone em suas vitórias. 

O Retorno de Simone Biles tem quatro episódios com cerca de uma hora cada, todos disponíveis na Netflix

Leia a crítica da primeira parte!

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