Pisque Duas Vezes

Não assista trailers, não leia sinopses, vá para a sessão de Pisque Duas Vezes com o mínimo de informações possível. Talvez, seja melhor até parar a leitura dessa crítica por aqui, e retornar após a sessão. Apesar deste texto ser livre de spoilers, e de ser extremamente contra intuitivo eu afastar meus leitores assim. Mas, acontece, que a boa estreia de Zoë Kravitz na direção tem muito mais impacto se encarada completamente no escuro. 

Resolveu continuar a leitura? Então segue uma vaga sinopse. Frida (Naomi Ackie) e Jess (Alia Shawkat) são duas jovens sem muito dinheiro e trabalham como garçonetes em festas luxuosas. Frida está particularmente empolgada ao servir a festa do ricaço de reputação questionável, mas recentemente "redimido" Slater King (Channing Tatum). Já que o bilionários a notou em uma festa anterior, e ela deseja ser reconhecida. As duas tanto se esforçam que acabam sendo convidadas para se unir ao grupo que vai passar uns dias na ilha particular do rapaz, onde elas tem as melhores férias de suas vidas, mas...

É o máximo que posso revelar do filme sem diminuir o impacto da experiência. Mas não precisa de muito para logo percebermos, que há algo de errado acontecendo ali. Afinal, nada é tão perfeito, e quando a esmola é demais, o santo desconfia. A surpresa fica por conta da revelação da real situação em que as moças se encontram, e na forma como Zoë Kravitz resolve contá-la. 

Não apenas aos poucos, como de costume em produções do gênero, mas de forma muito criativa. Aproveitando os excessos e absurdos das festas sem limites dos extremamente ricos para brincar com a percepção dos personagens e do público. Seriam as coisas estranhas que acontecem, resultado do uso "recreativo" de entorpecentes, ou haveria algo mais? O que é real, o que é ilusão? É possível confiar na própria memória?

Assim, pistas são apresentadas em meio a delírios de celebrações, de forma que só serão compreendidas completamente após o desfecho. Criando aquele tipo de obra, que vale a revisita para descobrir que detalhes da verdade estavam sendo mostrado todo o tempo. Nós apenas não entendemos. 

Para tal, a direção faz uso de posicionamentos e movimentações de câmera desconfortáveis. Momentos de montagem propositalmente desconexa. E elementos visuais marcantes, como o uso recorrente de um tom específico de vermelho. Os figurinos uniformizados e estranhamente perfeitos. Além de uma paisagem paradisíaca tão perfeita que perturba. Tal qual o comportamento das pessoas, divertidas e amigáveis como se se conhecessem por toda uma vida, e não houvessem problemas no mundo. 

O elenco bem escolhido entrega bem a dubiedade da situação, sem caracterizações complexas, trazendo o suficiente para diferenciarmos os personagens. A excessão é claro, fica por conta da protagonista vivida por Naomi Ackie, que como nosso avatar na trama, nos carrega ao longo de todo filme. Seja nos momentos de dúvida e confusão, seja quando está empolgada com as férias inesperadas. Ainda que para essa última, a acompanhemos com uma pulga atrás da orelha. Sabemos que vai dar errado, mesmo assim, vamos com ela. 

Outra que chama a atenção é Adria Arjona, que começa gerando uma antipatia em relação à Frida, e consequentemente a nós. Mas de forma surpreendente muda o jogo, e conquista  nossa confiança ao longo da projeção. Channing Tatum entrega uma atuação esforçada, dentro dos próprios limites. Enquanto outros rostos mais, ou menos, conhecidos facilitam nossa identificação dos personagens, como Alia Shawkat, Christian Slater, Haley Joel Osment e Geena Davis.

Pisque Duas Vezes não inovador, mas é bem produzido e criativo no que se propõe. Atiçar os nervos, e entregar uma catarse apoteótica em seu desfecho. Vale avisar, o filme é pesado e pode gerar gatilhos. Uma entrega surpreendente para uma diretora estreante, e um dos melhores filmes do ano. Bom ficar de olho nessa nepo-baby, que parece fazer jus ao espaço que tem!

Pisque Duas Vezes (Blink Twice)
2024 - EUA - 103min
Suspense

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