O Astronauta

Though I'm past one hundred thousand miles 
(Apesar de estar a mais de mil quilometros por hora)

I'm feeling very still 
(Me sinto bem imóvel)

And I think my spaceship knows which way to go
(E acho que minha nave sabe que caminho tomar)

Tell my wife I love her very much, she knows 
(Diga a minha mulher que eu a amo muito, ela sabe)

Caso não conheça, este é um trecho de  Space Oddity de David Bowie, que resume quase perfeitamente a trama de O Astronauta. As diferenças são que a música de 1969 vai muito além nas reflexões universais que o intimista filme estrelado por Adam Sandler. E, principalmente, diferente da canção, a esposa não sabe. Não tem como saber, e esse é o ponto!

O astronauta Jakub Procházka (Adam Sandler) embarca em uma corrida espacial solitária e claustrofóbica. Com a missão de alcançar e estudar uma misteriosa nuvem roxa que surgiu em nosso céu, antes dos enviados de outros países. Deixando para trás uma esposa grávida e igualmente solitária. Quando a moça para de se corresponder com ele, Jakub é visitado por Hanus (Paul Dano), um alienígena parecido com uma aranha, com quem tem diversas discussões sobre a vida.

O filme da Netflix é baseado no livro de Jaroslav Kalfar, usa a claustrofobia e solidão do protagonista diante do universo, literalmente, para fazê-lo refletir sobre sua vida na Terra. Mais especificamente, seu relacionamento com Lenka (Carey Mulligan). Esposa que está determinada a deixa-lo, embora ele ainda não saiba disso. 

Com Hanus, que nunca temos certeza se é real ou fruto da imaginação do protagonista, como guia, Jakub repensa e ressignifica sua relação. Através de discussões repetitivas e flashbacks enevoados, e beirando a loucura, independente do fato do aracnídeo alienígena ser real ou não.  Enquanto isso, na Terra, os responsáveis pela missão tentam proteger a saúde mental de seu astronauta.

Embora não haja nada de errado em utilizar um cenário grandioso, no caso o universo, para explorar um tema intimista. Pelo contrário, isso pode aprofundar temas extremamente relacionáveis. O Astronauta não consegue sair do lugar comum ao escolher tal abordagem. Centrado em diálogos, gira em círculos e se repete constantemente, antes de chegar a uma conclusão bastante previsível. 

Talvez, por focar demasiadamente no casal, e não o cenário em que estão inseridos, ou mesmo sua bagagem pessoal. Jakub por exemplo, tem um passado com o pai, que se relaciona com o cenário político da Republica Tcheca, onde vive e por quem defende o feito espacial. Mas essa história é apenas apontada, e nunca realmente elaborada pelo roteiro. O resultado é uma terapia de casal muito longa e dispendiosa, com um alienígena como psicólogo e apenas uma das partes sendo atendida. 

A direção de arte e figurinos é eficiente, especialmente na criação do módulo que se torna o pequeno mundo claustrofóbico do protagonista. Funcional, datado (para nós, completamente de acordo com o universo do filme), meio desgastado, e enlouquecedor para uma pessoa presa lá por seis meses. Os efeitos especiais acompanham, especialmente para construir a criatura alienígena. 

 Adam Sandler de vez em quando lembra que sabe atuar para além dos filmes de comédia em que interpreta o mesmo personagem. Se persistimos nesse filme até o fim, é em parte pela empatia que construímos com essa figura melancólica e meio egoísta. Paul Dano também faz um bom trabalho ao construir a figura etérea que mantém o debate vivo. Mas o restante do elenco, composto por  Carey Mulligan, Kunal Nayyar, Isabella Rossellini é completamente desperdiçado em papéis secundários com funções burocráticas no enredo. 

Estreia em longas metragens do diretor Johan Renck, O Astronauta, tem boa proposta, mas é conduzido da forma mais aborrecida e sem brilho possível. Soa como um episódio de Doctor Who, sem a aventura e diversão, deixando apenas a estranheza e as discussões que sozinha precisaria sair da superfície. Resta ao espectador duas horas de espera, para o homem do espaço ousar sair de sua cápsula, flutuar de um jeito peculiar, e enxergar as estrelas de forma diferente. 

O Astronauta (Spaceman)
2024 - EUA - 107min
Drama, Ficção científica

Post a Comment

Postagem Anterior Próxima Postagem