Capazes de assustar tanto quanto geram uma curiosidade quase mórbida, cultos religiosos extremistas isolados, são ricas fontes para autores de suspense e terror. Seja por todo mistério, mitologia, e até magia, envolto em suas histórias, seja pelo lado psicológico, a capacidade de arrebanhar pessoas com uma fidelidade inquestionável, ou ainda pelo lado criminal. Afinal, não são poucas as seitas que terminam nas páginas policiais de jornais. O Diabo em Ohio da Netflix, explora um pouquinho de cada uma destas vertentes.
A Dra. Suzanne Mathis (Emily Deschanel) é uma psiquiatra que por compaixão abriga uma ex paciente. A adolescente Mae (Madeleine Arthur) supostamente fugiu de uma vida de abusos e isolamento da sociedade. Entre o comportamento incomum da jovem, e acontecimentos estranhos Suzanne começa a desconfiar que a garota na verdade fugira de uma seita cheia de segredos sombrios que pode por em perigo toda a sua família.
A série começa a aborda esta história através do psicológico de vítimas de abusos domésticos recentes e passados, característica que une Suzanne e Mae. Desde a obsessão em seu trabalho de "salvar pessoas" da doutora, passando por domínio psicológico, seus gatilhos e a dificuldade de escapar deles. Conforme a trama, e os segredos, se desenrolam, outros temas são levados à luz. Todos inspirados em situações do mundo real, e alguns com mais ênfase do que outros. É dessa realidade que vem o medo atrelado à história.
A investigação policial, e a forte influência e aparato da comunidade que impede o avanço do Detetive Lopez (Gerardo Celasco),e ameaça qualquer um que chega perto. A interferência de Mae na vida da família Mathis e sua tentativa de se inserir na sociedade. E o mistério envolto por volta de rituais e magia que podem ou não estar interferindo nos acontecimentos.
Combine estes últimos elementos, a presença de Mae e a crença em magia, e temos a discussão que ocupa mais espaço, e mais aguça o interesse do público. Existe mesmo magia (maligna, diga-se) neste universo? Mae está sob influência dela, ou é apenas uma fugitiva psicologicamente perturbada? Suas atitudes estranhas tem um segundo interesse, ou são apenas fruto de sua criação isolada e a necessidade de aceitação? Assim passamos os oito episódios desta minissérie oscilando entre nossa empatia com a adolescente, e nosso temor pela família de Suzane. A curiosidade sobre a resposta completam o pacote que garante nossa atenção, e algumas unhas roídas, por toda a serie.
A inclusão de dilemas adolescentes e familiares, especialmente na relação entre Mae e a filha do meio da família Jules (Xaria Dotson), é uma escolha incomum para o gênero que oferece alguns pontos de vistas interessantes. Já que a necessidade de ser popular na escola entra como um traço de psicopatia inesperado em uma série focada em uma seita isolada da sociedade. Além de oferecer oportunidades para algumas referências, e mais personagens com quem nos preocuparmos. À certa altura tememos por toda a família Mathis, não apenas Suzanne. O elo fraco aqui é irmã mais velha, Helen (Alisha Newton) tem uma trama mais isolada, que por vezes chega até a ser esquecida pelo roteiro.
Uma fotografia cinzenta e desbotada, e closes que se aproveitam bastante dos olhos expressivos de Madeleine Arthur, constroem a atmosfera de desconfiança e estranheza constante. Não é preciso que algo seja dito para termos certeza de que algo não está certo. Símbolos, e sugestões dão os toques de terror que a história pede, sem necessidade de apelar para violência mais visceral ou direta.
As atuações são boas, mas não trazem grande entregas. Emily Deschanel não se distancia muito do trabalho que entregava em seu papel mais famoso, Bones. Mesmos trejeitos e postura, a diferença fica por conta da capacidade empática de Suzanne, mais latente aqui. O destaque fica com Madeleine Arthur que consegue manter a ambiguidade de sua personagem inabalável ao longo de todos os episódios. Enquanto a pequena Naomi Tan rouba a cena sempre que canta.
Já o ritmo da trama é crescente, apresentando respostas e perigos gradualmente, até que culminem no embate do clímax. Este resolvido de forma bastante simples e rápida, considerando toda a construção prévia. Entretanto, o final inesperado vai além de um embate curto, e evolve o destino das duas protagonistas. Falar mais que isso seria spoiler, mas posso dizer o final pode assustar e incomodar alguns. Uma vez que assim como na vida real, o perigo continua a espreita de uma forma ou de outra.
Vale lembrar, esta é uma minissérie baseada em no livro homônimo de Daria Polatin. É uma história fechada, não existem planos para episódios futuros. Situações e respostas não resolvidas, ficam a cargo da imaginação do público. Um jeito interessante, de manter o espectador, com a sensação de incômodo e ameaça do suspense, mesmo após o fim da série.
O Diabo em Ohio não é uma série super original e inovadora, mas sustenta bem seus mistérios até o fim. Assim, instiga e mantém o público constantemente alerta e interessado, sem precisar apelar para explicações rápidas e sustos óbvios. É uma boa pedida para quem curte um suspense, tramas sobre seitas misteriosas e tem fôlego para segurar a respiração por muitos episódios.
O Diabo em Ohio tem oito episódios com cerca de uma hora cada, todos já disponíveis na Netflix.
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