Apesar do título, não são exatamente os primórdios dessa super equipe, ou melhor superfamília que vemos em Quarteto Fantástico: Primeiros Passos. Talvez seja os primeiros desafios realmente grandes (um vilão extraterreno e a paternidade). Mas acredito que a intenção é que seja a nossa primeira incursão nessa nova faceta do MCU. A promessa é um novo visual, nova dinâmica, até uma nova "Terra", para reavivar um universo que há muito já estava desgastado com o público. A questão é a Marvel conseguiu cumprir a promessa?
Já fazem quatro anos que, Reed Richards (Pedro Pascal), Sue Storm (Vanessa Kirby), Johnny Storm (Joseph Quinn) e Ben Grimm (Ebon Moss-Bachrach) sobreviveram ao acidente em sua missão espacial que lhes concedeu superpoderes. E desde então assumiram o papel de defensores da Terra. Sempre bem sucedidos em resolver os problemas da humanidade.
A história de origem dessa vez é uma breve introdução no estilo documentário ou reportagem de TV, apenas para colocar todo o público, fãs e não iniciados, na mesma página. Até porquê, esta essa origem já fora contada nos cinemas duas vezes nos últimos vinte anos. Assim, Primeiros Passos vai na contra mão de seu título, e já nos coloca em um cenário de heróis já estabelecidos, que vão enfrentar seus maiores desafios até então.
O primeiro deles a paternidade e seus prazeres, já que Sue está grávida pela primeira vez, e além das preocupações típicas de novos pais, ela e Reed, principalmente ele, se preocupam com o resultado da combinação de seus DNAs alterados. O segundo é a chegada da Surfista Prateada (Julia Garner), e o anúncio do fim do planeta pela fome de Galactus (Ralph Ineson), o Devorador de Mundos.
O tempo é contado, tanto para o nascimento do bebê, quanto para a de derrota do vilão, antes que este chegue à Terra. E é quando esses dois desafios se interpõem, que a situação se torna insustentável. Voltando a opinião pública contra eles, e os obrigando apostar em "últimos recursos" para salvar o planeta e a família.
Família, este é o foco do roteiro deste novo Quarteto Fantástico, apresentar o grupo muito mais como uma família do que como uma super equipe. Trazendo seu relacionamento como guia para suas ações, e até inspiração para a humanidade. Inspiração até demais, já que neste mundo o que eles falam parece ser lei, ao ponto de nos perguntarmos, se ainda existem governantes nesses países. Aparentemente todos se acomodaram a seguir e serem protegidos pelos protagonistas, ao nível de uma dependência pouco natural, ou saudável.
Ao mesmo tempo que o filme trata o mundo como dependente dos heróis, também não nos mostra esse mundo de fato. Com o foco da ação majoritariamente nos Estados Unidos, terra natal dos personagens, não transmite a sensação de coletivo. Do interesse, reação e envolvimento mundial diante dos eventos da trama. Mas estes são problemas pontuais, não chegam a atrapalhar nosso envolvimento com a jornada, afinal são os heróis quem viemos ver. E estes o roteiro entrega, com um bom e dedicado elenco.
Pedro Pascal entrega um Reed Richards brilhante, pragmático e que pega para si a responsabilidade por tudo e todos. Johnny Storm de Joseph Quinn e Ben Grimm e Ebon Moss-Bachrach, são os contrapontos que se completam. Servindo de apoio para o casal, e também de alívio cômico para manter o clima "family friendly" da produção.
Mas, é na Sue Storm vivida por Vanessa Kirby, que está o coração do filme. Uma vez que a personagem é o oposto que completa o marido, cabe a ela ser o contraponto emocional ao pragmatismo dele. Não que Reed seja frio, mas ele não se permite abalar pelos problemas. É ela quem representa o lado humano dessas preocupações do casal, e consequentemente consegue pensar e agir para além da ciência. Não atoa, o roteiro a mostra como responsável pela diplomacia nas missões da equipe. O que também possibilita um bom paralelo entre ela e Surfista Prateada, ambas mães se sacrificando para proteger seus filhos, e todo o planeta.
E por falar nos vilões, a eficiente Julia Garner não pode fazer muito por trás da frieza e do CGI da sua personagem, cujo visual é bom, mas nada excepcional. Ela tem sim um aprofundamento em suas motivações, mas sua redenção é corrida e simplificada. Mesmo assim, é uma vilã mais complexa que seu mestre. Uma entidade para além de nossa compreensão, Um ser etéreo, cujo poder de devastação é anunciado, mas não de fato visto até o clímax. E este como se resume à uma grande batalha em Nova York, muito boa, mas ainda extremamente localizada nos Estados Unidos, em uma cidade apenas, não passa o senso de ameaça global que deveria.
Dito isso, o grande embate final é sim empolgante, bem orquestrado, e nossa empatia pelos heróis já é suficiente para nos manter conectados. Mas eu gostaria de ter visto uma preocupação maior, para além dos protagonistas apenas.
Se a ação é bem orquestrada, e faz bons usos das habilidades dos personagens, o CGI necessário para compor esses poderes é bastante oscilante. Os estragos de Galactus e os poderes de Sue são extremamente bem feitos. Mas toda vez que vemos o Coisa segurando o bebê, ou o Tocha Humana completamente em chamas, sentimos uma sensação de estranheza, e até de efeitos ultrapassados. Já o Sr. Incrível usa muito pouco suas habilidades elásticas, o roteiro prefere focar em sua inteligência como superpoder. E agora que os escrevi, percebi, em poucos, ou mesmo nenhum momento, os heróis são chamados por seus codinomes, apenas seus nomes de batismo. Ainda não sei se é relevante, mas é algo a observar.
Meu ponto favorito da produção, no entanto, é a caracterização e construção de mundo. Passado em um universo diferente dos demais filmes do MCU, mais especificamente na Terra-828. O presente desses heróis tem um gostinho de nosso passado. Um visual retro futurista, que evoca a década de 1960, fazendo paralelos com a, época em que foram criados nos quadrinhos, e consequentemente o visual original dos personagens e de seu mundo. E claro, com a corrida espacial, uma vez que estes heróis também são astronautas.
Além do fato de ser visualmente muito charmoso e bastante distinto de tudo que vimos no estúdio até então. Do robozinho H.E.R.B.I.E. (Matthew Wood), passando por toda a tecnologia, até decoração da casa dos personagens. Curioso é que o design de produção lembra bastante os Incríveis da Pixar, que por sua vez, são inspirados no Quarteto. Então se pensar na família Pera, não se surpreenda é só a cultura pop se retroalimentando.
Uma pena que a linguagem desse período se limite à mídia, programas de TV, documentários e propaganda visual. Enquanto a linguagem da narrativa em si segue o patrão Marvel de aventura. Mudar também o estilo de linguagem seguindo o visual poderia ser mais um diferencial. Mas acredito que seria arriscar demais. E por falar nos padrões do estúdio, tem duas cenas pós créditos, uma delas prenunciando aventuras futuras. Mas não o extremamente alardeado retorno de um certo ator ao universo Marvel, ainda.
Quarteto Fantástico: Primeiros Passos é uma aventura em família, e para a família. Traz boas novas versões dos heróis, um mundo visualmente novo, não inova muito na narrativa. Mas é caprichado, bem intencionado, eficiente e divertido. Se isso é suficiente para reavivar o interesse do público pelos heróis desse universo, é o próprio público quem vai definir. Qualidades para isso o filme tem, e de sobra.
Quarteto Fantástico: Primeiros Passos (The Fantastic Four: First Steps)
2025 - EUA - 115min
Ação, Aventura, Ficção-científica
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