Eu não sei vocês, mas ultimamente tenho tido a sensação de que não há tema para o qual o Globoplay não tenham um documentário. Por esse ponto de vista, Xuxa - O Documentário até demorou a chegar, considerando a popularidade do ícone dos baixinhos e sua longa trajetória com a emissora dona do streaming.
O documentário dirigido por Pedro Bial aborda toda a trajetória da rainha dos baixinhos, desde seus dias de modelo adolescente, até o momento atual de mulher madura e bem resolvida (ao menos essa é impressão que a obra pretende passar). E o faz com a própria retratada como principal voz. É a vida da Xuxa contada pela própria Xuxa. Com reforços de amigos, funcionários, produtores e colegas de palco que visivelmente estão "do lado dela" da narrativa.
Felizmente a obra não nega sua postura "chapa branca", que omite momentos menos elegantes das atitudes da apresentadora. Como seu atrito com Adriane Galisteu por causa de Ayrton Senna, e os rumores sobre supostos pactos demoníacos. Este último, já abordado pela Xuxa em uma propaganda da Netflix, e que se tratado com bom humor poderia ser um dos melhores momentos da produção.
Existem outras polêmicas, no entanto, das quais não há como fugir. Como sua participação no filme Amor, Estranho Amor de Walter Hugo Khouri, onde ela então com dezoito anos, faz uma cena de nudez com um garoto de treze. O episódio é abordado através de um visivelmente desconfortável encontro entre a rainha dos baixinho, e o ex ator mirim Marcelo Ribeiro. Ambos relatando o evento do ponto de vista de meras vítimas. O que de certa forma são.
Entretanto nenhuma polêmica é mais esperada que o reencontro entre Xuxa e Marlene Matos. A conversa, estrategicamente colocada no penúltimo episódio, mostra os resquícios de uma relação intensa que terminou de forma frustrante e mal explicada. Mas enquanto a apresentadora parece querer colocar tudo em pratos limpos, assumindo sua parcela de culpa por se deixar manipular, a ex-produtora é irredutível em seus atos, e convenientemente alega ter esquecido os mais comprometedores.
Marlene errou, e pagou por isso, já que nunca conseguiu êxito igual em sua carreira. É visível que tem consciência disso, mas ela nunca desce do pedestal, que construiu com suas crenças e jeito de ser. O que faz com que o conflito continue sem resolução, um desfecho anticlimático não apenas para a audiência, mas para a própria Xuxa.
Apesar de tudo isso, é o episódio final que traz o momento em que a retratada se mostra mais vulnerável e genuína, ao falar abertamente dos abusos que sofreu na infância. Uma conversa difícil, que ainda precisa ser repetida a exaustão em nossa sociedade. Outro evento delicado e marcante é o incêndio nos estúdios do Xuxa Park, que vitimou várias crianças.
Mas nem só de polêmica vive Xuxa - O Documentário! O sucesso meteórico, a carreira internacional, o excesso de trabalho, seus romances, a chegada de sua filha e as mudanças decorrentes da maternidade. Tudo é abordado de forma a demonstrar como Maria da Graça Meneguel se tornou ícone da cultura pop brasileira. O que é surpreendentemente esclarecedor para quem, como eu, cresceu acompanhando a loira, e na ingenuidade infantil nunca teve dimensão clara de seu estrelato.
Com a própria retratada como curadora e produtora, é irreal cobrar imparcialidade de Xuxa - O Documentário. Bial tem ciência disso, e em momento algum esconde que está é a história de Xuxa, contada por Xuxa. É como a apresentadora revisita e entende a própria vida. Talvez não seja o que muitos esperam, mas é um panorama bastante satisfatório do ícone em que ela se transformou.
Xuxa - O Documentário é uma série documental de cinco episódios com cerca de uma hora cada, todos já disponíveis no Globoplay.
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