A Lenda do Cavaleiro Verde

Como consumidores constantes de blockbusters, é curioso perceber que existem filmes que parecem não estar preocupados em agradar audiências. Alguns deles querem apenas contar sua história, de determinada forma, agrade a quem agradar. Sucesso de crítica que acaba de chegar ao Prime Vídeo, é uma destas obras.

A Lenda do Cavaleiro Verde adapta lendas arturianas, em especial o poema Sir Gawain and the Green Knight (Dom Galvão e o Cavaleiro Verde, na versão em português). Conta a história de Gawain (Dev Patel), sobrinho do Rei Arthur, que aceita um enigmático desafio do misterioso Cavaleiro Verde (Ralph Ineson). Este o leva em uma jornada pelo desconhecido para provar seu valor como cavaleiro. 

A partir da sinopse acima, é possível imaginar que se trate de uma tradicional aventura cavalheiresca na estrada. Mas o longa de David Lowery está muito longe de ser tradicional. À começar pelo ritmo, mais lento e contemplativo, passando pelas aspirações do protagonista que está longe de ser, ou mesmo se tornar o modelo de cavaleiro, até as inúmeras metáforas, reflexões e estranheza em torno de cada acontecimento da jornada. Escolhas que vão invariavelmente afastar o público comum, cuja curiosidade pode não superar  a lentidão e a falta de clareza do roteiro. 

E por falar em clareza, a fotografia absurdamente escura é outro fator que pode afastar o público. Em defesa da produção, neste caso ela fora é prejudicada pela distribuição nacional diretamente no streaming. Se por um lado a plataforma alcança mais pessoas, especialmente nesses tempos de pandemia, por outro as condições variadas que cada espectador tem disponível pode contar pontos contra. Na sala escura dos cinemas, a pouca luz da produção cria uma atmosfera sombria e tenebrosa, coisa que poucos conseguem replicar em casa, ficando apenas com a dificuldade de enxergar o que está na tela. Quer uma dica? Assista à noite, com todas as luzes apagadas.


De volta à narrativa do filme, são as metáforas os pontos fortes do filme. Isto é para aqueles, com disposição e paciência para buscá-las. Enquanto Gawain é testado em relação as qualidades de um cavaleiro, a produção nos entrega imagens, ricas em subtextos, interpretações e até em diferentes possibilidades para uma mesma história.  Colocando sob questionamento tanto sua honra, quanto seu destino. Sem nunca oferecer uma resposta definitiva para ambos, com uma ambiguidade que permanece até os créditos finais. 

Patel se esforça para transmitir toda a insegurança, falhas e desejos de Gawain, que quer ser grande, mas talvez não tenha o que é preciso para tal. Outros destaques são Alicia Vikander e Erin Kellyman, com atuações precisas e marcantes, em meio a um elenco eficiente. Joel Edgerton, Sarita Choudhury, Sean Harris, Kate Dickie e Barry Keoghan também estão em cena.

 Já a reconstrução de época, apesar de excelente, tem grandes anacronismos conscientes. A produção parece remontar os séculos XIV e XV, quando as versões conhecidas das lendas arturianas foram escritas. Uma escolha proposital, que podem irritar os fãs mais fervorosos do Rei Arthur. Somada à fotografia, e aos planos exaltadores, a produção constrói um ar épico, ainda que sua história não tenha toda esta pompa.

Particularmente, eu adoraria que a obra conseguisse ser mais envolvente e menos tediosa, para que fôssemos mergulhados apropriadamente nesta atmosfera assombrosa e grandiosa, aproveitando melhor suas inúmeras nuances e metáforas. Mas, assim como um bom poema A Lenda do Cavaleiro Verde é um filme complexo está aberto a interpretações. Também como obras escrita em versos, pode não ser o melhor formato para alcançar todos os públicos. Ou seja, haverá quem ame, e quem odeie na mesma intensidade. 

A Lenda do Cavaleiro Verde (The Green Knight)
2021 - Irlanda/EUA - 130min
Aventura, Drama, Fantasia

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