Você pode não acreditar, mas as versões literária e televisiva de The Leftovers são ao mesmo tempo parecidas e completamente diferentes! Um fenômeno curioso, mas também a melhor parte de se ter várias - boas - versões para uma mesma história. A essência é a mesma, mas cada linguagem desenvolve os problemas e personagens de um jeito.
O ministério dos "spoilerfóbicos" informa: este post contém SPOILERS do livro e da série!
Faz alguns anos que 2% da população mundial simplesmente desapareceu, em um instante, sem aviso prévio, explicação, ou retorno. Pode não parecer muito, mas este percentual é suficiente para que todo mundo que ficou para trás conheça ao menos uma pessoa que tenha partido. No livro e na primeira temporada da série da HBO acompanhamos a vida de alguns moradores da pequena Mapleton.
1 - Mais moradores!
As diferenças começam já no número de personagens. O foco do livro está na família Garvey (Kevin, Lauren, Jill e Tom) e em Nora que perdeu toda a família. A série cria um arco para o reverendo Jamison. Um personagem pequeno no livro, que na TV virou irmão de Nora e tem uma esposa em estado vegetativo. O que acrescenta um ponto de vista religioso do suposto arrebatamento que o livro não abrange.Também vemos um pouco mais dos Remanescentes Culpados, "RC", e seu relacionamento com as sociedade, principalmente na figura de uma de suas líderes Patti Levin. O "Santo Wayne" falso messias também ganha interações com alguns personagens, no livro ele é apenas uma figura constante nos noticiários e motivação para as ações de Tom e sua companheira de viagem Christine.
2 - Uma Nora diferente
Já mencionei que na série o reverendo Jamison se tornou irmão de Nora, o relacionamento deles é bem próximo. No livro Nora tem uma irmã que até tenta incluí-la em sua rotina mas não consegue. A mulher que perdeu tudo (marido e filhos) em 14 de Outubro, é solitária e sem objetivos. Na série ela ainda é solitária, mas tem um trabalho. Ela entrevista pessoas, para descobrir se seus entes queridos realmente desapareceram no arrebatamento, ou estão tentando dar um golpe no seguro.O programa nos dá outro detalhe que a visão intimista dos livros deixa de fora, como o governo tenta compensar a população por um evento inexplicável. E como as pessoas reagem à essa "oportunidade". Não é só receber dinheiro, a bateria de perguntas da entrevista é bastante desconfortável.
Além disso, a mudança enriquece o arco de Nora que no livro se limita em superar a dor e se relacionar com Kevin. Ela é vista como um símbolo de superação, apesar não ter superado a perda da família. Precisa lidar com a vida profissional, e até faz uma viagem onde esbarra com outro personagem que não tem tanto destaque no livro e veremos no tópico a seguir.
3 - Santo Wayne
No livro, o suposto Messias é na verdade um aproveitador que criou uma religião em torno de si, com direito a adolescentes fazendo fila para ser mãe de seu filho, o escolhido. Tudo que sabemos dele é através de notícias e das experiências de devoto Tom e sua protegida Christine, grávida de Wayne. Na TV o personagem ganha rosto e um passado com motivações que não justificam, mas explicam seus atos. Também podemos vê-lo em ação quando Nora tenta se livrar de sua dor ao ter um encontro com ele. 4 - Kevin Garvey chefe de polícia ou prefeito?
No livro o patriarca da família Garvey é prefeito de uma cidade pequena. Um cargo que aparentemente não dá muito trabalho de acordo com sua rotina. Já na TV ele é chefe de polícia, o que o coloca mais na ação do dia-a-dia da cidade. O que é conveniente para coloca-lo como protagonista, diretamente em contato com todos os personagens da cidade e principalmente em confronto direto com RC. Kevin também ganha um pai, ex-policial com problemas mentais. Em uma sociedade traumatizada, com um trabalho de estressante e de alto risco quem não temeria que a loucura fosse genética. Outro conflito exclusivo da série.
5 - Aimee
Sem tanto trabalho e conflitos internos, no livro quem tem um bom destaque no relacionamento com Kevin é a amiga de sua filha Aimee. Ela também existe na série com um arco bem parecido, mas nas páginas a personagem tem mais importância e um desenvolvimento mais envolvente para o leitor. É muito interessante, vê-la crescer enquanto Jill continua adolescente. 6 - Remanescentes Culpados
Em ambas as produções acompanhamos o dia-a-dia dos remanescentes culpados principalmente por Lauren e sua pupila Meg. Os hábitos e dogmas da seita são idênticos, mas seus planos muito distintos. Enquanto nos livros o plano é centrado na própria seita, embora eles digam que querem relembrar as pessoas da partida, na série o plano realmente é global e pretende chocar a sociedade. Mas não posso falar muito de nenhum dos dois para não estragar sua experiência. Os pequenos conflitos do dia-a-adia entre os RC e a sociedade também aparecem mais na série, já que há mais personagens em foco e Kevin está sempre tentando solucionar algum deles.
7 - Jill e os RC
Completamente perdida desde que a mãe largou tudo para se unir aos Remanescentes Culpados, a adolescente Jill é aliciada pela internet por uma conhecida para entrar para a seita. Na série a menina acaba parando na mansão dos RC em meio a um conflito com as "pessoas normais", fazendo com que seu pai precise salvá-la no clímax da temporada. Na série ela está a caminho, malas feitas e tudo, mas uns amigos oferecem uma carona e ela acha mais interessante passar um tempo com eles. Simples assim!
8 - E o livro acaba por aqui...
Apenas um livro, nada de séries ou sequencias, sim isso ainda existe e é excelente! The Leftovers nas páginas é um recorte de um período nas vidas dos personagens, e termina com um caminho melhor a seguir, mas sem nenhuma certeza de como as histórias de Kevin, Jill, Lauren, Nora e Tom vão terminar. E a graça está nessa semelhança com a incerteza com a vida real.
Intencional ou não, a série já começou seu primeiro ano expandindo o universo e continuou contando a história por mais duas temporadas. Sempre com Kevin como ponto central e escolhendo a dedo os personagens que o acompanhariam a cada momento. E claro explicar muita coisa, ou mesmo oferecer certezas na vida dos personagens, deixando para o expectador a tarefa de tirar suas próprias conclusões.
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Diferentes, mas com a mesma essência. As duas versões The Leftovers souberam aproveitar o melhor do que cada formato poderia oferecer. Para quem lê este exercício de linguagem, pode parecer que o livro tem menos conteúdo que a série, mas não se engante é o seu clima intimista e introspectivo, é tudo sobre os personagens, que nos mantém envolvido. Já a série descobriu que podia, e precisava, colocar seus personagens em batalhas e confrontos diferentes para funcionar nas telas.
Então fica a dica, se puder leia o livro e veja a série, e depois nos diga qual experiencia gostou mais. Garanto que ambas tem suas qualidades.
Leia a crítica do livro The Leftovers e de todas as 3 temporadas da série da HBO.



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