A Praia do Fim do Mundo

Com certeza você já ouviu dizer que futuramente o aquecimento global derreterá as calotas polares, e com isso o nível dos oceanos vai subir, e eliminar cidades inteiras. O que você pode não ter ouvido, é que a natureza já está reinvindicando territórios há tempos. Também por ação humana, embora mais pontual, como no caso da praia do Icaraí, no município de Caucaia no Ceará, que serviu de cenário para A Praia do Fim do Mundo.

Não conhecemos os motivos da erosão que assola a cidadezinha fictícia de Ciarema. Antes um paraíso turístico luxuoso, agora um empilhado de ruinas e pedras assolados pela força do lar. Os motivos pouco importam para a história que Petrus Cariry escolheu contar. O diretor está interessado nos efeitos da devastação na vida dos moradores da região.

Mais especificamente de Alice (Fátima Macedo) uma jovem ambientalista, que vive com a mãe Helena (Marcélia Cartaxo). Uma idosa doente e teimosa, que se recusa a notar o avanço do mar e a inevitável erosão de sua casa. O único patrimônio da família, outrora uma pousada que garantia seu sustento. Como apoio e companhia a moça conta com a amiga Elisa (Larissa Góes), com quem observa e divaga sobre a Ciarema de antes.

E assim acompanhamos seu cotidiano, trabalhar, tentar persuadir a mãe, observar o mar invadir as casas, conversar com a amiga sobre isso, especular sobre o misterioso homem que vaga catando lixo pela praia. Repetidamente, sem grandes alterações na rotina. E quando essas mudanças finalmente acontecem, até geram certa reflexão, mas nunca uma grande mudança no ciclo vicioso em que os personagens parecem estar presos.

O objetivo parece ser estimular a reflexão apenas, com possibilidades reforçadas pela incursão de atmosfera mística em torno de algumas ações. Especialmente da mãe e do homem misterioso (Carlos César). E após muito rodear sobre a vida dessas mulheres e a falta de perspectiva de algo melhor, é no lado enigmático que A Praia do Fim do Mundo concentra seu desfecho. Com mais perguntas que respostas, em um estilo David Linch, mas sem imagens tão viscerais quanto as do diretor de Eraserhead.

Escolha que obviamente, não conversa com o grande público. Assim como a opção de filmar em preto e branco, que refoça a desesperança, mas talvez amenize a devastação. Mas tudo bem, este nunca fora o objetivo do filme. Caso contrário a trama focaria em resgatar as personagens, de seus cotidianos limitados de desfecho cruel. Cariry aqui quer apenas observar esse destino que assola e assolará muitas famílias vulneráveis às forças da natureza e ao descaso do governo. Este último praticamente inexistente aqui.

Com isso, o elenco se concentra em uma atuação mais introspectiva, mais contida. Os destaques ficam com Marcélia Cartaxo, que dá vida à uma filha cansada de lutar, mas que não pode simplesmente parar. Fazendo assim o possivel para sobreviver. E Fátima Macedo, no retrato perfeito de quem não consegue aceitar, ou sequer ver, que a vida que planejara acabou.

A Praia do Fim do Mundo é contido e reflexivo ao contar os efeitos de um evento gradioso, a natureza retomando seu lugar. Não engaja um grande embate ou ação dos personagens, mas convida a refletir sobre pequenês humana, e o pouco que podemos fazer diante de forças maiores que nós. Especialmente se não exergarmos perspectivas para tal.