Era Uma Vez um Gênio

O que tem mais valor, uma história ou um desejo? É isso que Era Uma Vez um Gênio, novo filme de George Miller reflete, ao recriar o formato dos contos de As Mil e Uma Noites em parâmetros atuais. Oferecendo uma jornada pelos tempos, sobre o poder das histórias e os perigos de um desejo. 

Alithea (Tilda Swinton) estuda narrativas e figuras mitologias, que viaja pelo mundo dando palestras do tema que domina. Em uma de suas viagens ela liberta um Djinn (Idris Elba), ou gênio da lâmpada, que lhes oferece três desejos em troca de sua liberdade. Desconfiada da natureza destes desejos, ela se recusa a usá-los, e ele decide contar sua vida na tentativa de convencê-la. 

É através da narração do gênio que os melhores momentos do filme se desenrolam, conforme o personagem nos leva a diferentes épocas da história, através de suas experiências. É claro, graças ao ceticismo da personagem de Swinton a dúvida sobre o que o Djin relata sempre paira no ar, mas suas histórias são tão ricas a interessante que inevitavelmente ela (e nós) se vê envolvida pelas aventuras de sultões, reis e seres mitológicos.

Não tão empolgante, mas ainda muito complexa é a vida além desta narração. Inicialmente confinada em um minimalista quarto de hotel, que serve de contraponto para os reinos ricos e coloridos para onde o gênio nos leva. Mais tarde em uma Londres atual (mesmo, as máscaras da Covid19 marcam bem o momento) cinzenta e agitada. Onde a tecnologia substituiu e tornou a magia obsoleta. Nos fazendo questionar porque "outros tempos" parecem render histórias mais empolgantes. 

O que se reflete na história, apesar de cheia de reflexões a sequencia que se passa no presente, soa muito mais monótona, comum, e ouso dizer, mais próxima da vida real. E consequentemente, menos empolgante que as fábulas. O que para alguns pode soar como um desequilíbrio do roteiro. Particularmente acredito que com o tempo a história de Alithea e o Djin se tornará mais rica e interessante, como as demais histórias contadas para gerações futuras. Conforme a familiaridade com a época se dissipa, trechos são esquecidos, ou aumentados, e a "vida real" se torna fábula.

Ao mesmo tempo que aponta o poder das histórias, sejam elas verdadeiras ou fictícias, o longa também alerta para o perigo dos desejos. Um exemplo perfeito do "cuidado com o que desejas", ou ainda de que "toda magia tem um preço", neste caso, consequências de se ter tudo que quer indiscriminadamente. Temas muito mais explorados no cinema, e por isso abordado de forma mais simples por Miller. 

Diretor experiente e versátil, tendo feito obras tão distintas como as franquias Mad Max e Happy Feet, George Miller transita com facilidade entre as diferentes épocas, dando personalidade distintas para cada uma das histórias. E ainda com ajuda da fotografia e direção de arte, as torna fábulas grandiosas, sejam elas passadas em vastos reinos ou confinada em pequenos quartos. Além de distribuir símbolos e metáforas a serem "encontrados" e analisados conforme mergulhamos nesses mundos. 

Sempre apostando na excelente dinâmica entre Elba e Swinton, que não decepcionam. Ele oferecendo toda a imponência, mistério e sabedoria que sua criatura mítica com centenas de anos carrega. Ela compensando a fragilidade de sua condição humana e solitária, com pensamento crítico, que aos poucos se desfaz e aceita a magia e companhia em sua realidade. Ambos entregando de forma nada simplista a química de opostos que devem construir. Será que ele realmente queria ficar, ou o fez apenas por desejo dela?

Era Uma Vez um Gênio é um filme incomum, e por isso talvez seja incompreendido por alguns. É uma empolgante história sobre o poder das histórias, e nossa necessidade e apreço por elas. Sobre como podemos tirar sabedoria e entretenimento de uma trama bem contada, seja ela real ou não. Exatamente o que o cinema, séries e literatura tem de melhor a nos oferecer.

Era Uma Vez um Gênio (Three Thousand Years of Longing)
2022 - EUA/Australia - 108min
Drama, Fantasia

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