Matrix Resurrections

Alguns filmes são tão completos que não precisam de releituras ou continuações. Mesmo assim, lá no início dos anos 2000, Matrix ganhou duas sequencias. Reloaded é mediano. Revolutions não encerra a franquia satisfatoriamente. Logo, o anúncio de um quarto filme duas décadas mais tarde, acende a expectativa de uma nova ideia que encerre melhor a jornada neste universo. 

Thomas Anderson (Keanu Reeves) vive uma vida cotidiana em um mundo onde Matrix é apenas um game que ele criou. Além do trabalho, faz terapia para lidar com transtorno supostamente causado pelo trabalho, a incapacidade de distinguir realidade de ficção. É claro, logo surge um convite que mostra que o protagonista talvez não precise de terapia.

Matrix Resurrections tem um primeiro ato bastante semelhante ao longa original. Desde a perseguição inicial, até a vida cotidiana e a proposta de atravessar o espelho da realidade. A diferença aqui é a consciência do conceito da Matrix por parte dos personagens. Em um não muito original, mas divertido exercício de metalinguagem, trazendo a trama da trilogia original como ficção para o cotidiano do Sr. Anderson e aqueles que o cercam.

É a partir do segundo ato, que a produção se propõe a trazer algo novo. Situar esta nova trama na cronologia da franquia, contextualizar os personagens no momento atual criar conceitos e ramificações próprias. A primeira tarefa é a mais simples, décadas se passaram desde Revolutions. Já as demais, o longa tem dificuldades em executar.

O roteiro escolhe explicações rocambolescas para retornos de personagens. Problema que tem sido recorrente na filmografia das irmãs Wachowski, desde Cloud Atlas. Vale mencionar, dessa vez Lana criou o roteiro na companhia não de sua irmã, mas de David Mitchell e Aleksandar Hemon, que já trabalharam com ela no também rocambolesco final de Sense8. Michell é também autor do livro em que Cloud Atlas é baseado.

Ao mesmo tempo que o roteiro constrói novas dificuldades complexas para desafiar os personagens, faz uso de atalhos e facilitações, para que a história ande na velocidade desejada. O resultado são muitas explanações jogada na tela, conveniências como "tecnologia mágica", e pouca profundidade nas discussões apresentadas.

Se o primeiro Matrix explodiu a cabeça do público, com conceitos como livre-arbítrio, realidade, simulação e sacrifício. Este longa traz de volta vários destes temas, mas os aborda de forma rasa e pouco original. O mesmo vale para temas novos, que são poucos. Entre eles a verdadeira liberdade de escolha, quando há apenas duas opções. Ou ainda a conformidade com o status-quo, e a falta de reconhecimento de que, apesar da suposta paz, a luta pode não ter terminado.

Autorreferência, reparações de detalhes desaprovados das duas sequencias, e muitas referências, são as outras preocupações do roteiro, que apesar de se esforçar para trazer algo novo em seus dois terços finais, acaba por entregar uma história muito semelhante ao desfecho do original. Um grande resgate, a resposta ao chamado, o poder que vem com ele, e as possibilidades que estes poderes trazem.

A sensação de que "novas aventuras" podem partir deste desfecho, é exatamente a mesma que o primeiro filme entrega. E talvez seja realmente a intenção, já que o próprio filme especula isso, ao autorreferenciar o retorno da franquia.

Os efeitos especiais e cenas de ação, são excelentes como esperado. Especialmente as máquinas criadas em CGI, que se beneficiam da evolução da tecnologia. No elenco novo, o destaque fica com os personagens de Neil Patrick Harris e Jessica Henwick. Não é por acaso, já que é para eles que o roteiro reserva mais agência e originalidade. Yahya Abdul-Mateen II e Jonathan Groff soam deslocados ao resgatar personagens antigos em novas versões.

Acima de tudo, são Neo e Trinity (Carrie-Anne Moss) aqueles quem realmente queremos ver. E sim, o retorno da dupla compensa! Reeves e  Moss, renovam a antiga química e carisma. Mesmo que ele pareça estar no piloto automático. Já ela é eficiente em mostrar as facetas de Trinity, que o roteiro propõe, conferindo ainda mais força e empatia para com a personagem.

Matrix Resurrections cai na curiosa categoria de sequencias que são também reboots. Poderia aproveitar para renovar seus temas e mitologia, afinal a tecnologia e os conceitos de realidade virtual, inteligência artificial, nuvem e afins, mudaram muito desde 1999. Entretanto, a produção prefere seguir um caminho menos ousado. Arrisca pouco e aposta muito na nostalgia, consequentemente trazendo menos momentos icônicos e marcantes. Se isto é o suficiente para justificar o retorno à franquia, o público e o tempo hão de dizer!

Matrix Resurrections (The Matrix Resurrections)
2021 - EUA - 148min
Ação, Ficção científica

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